“Nesse sentido, tanto o projeto relativo aos ‘Caminho de Pedra’ quanto àquele que promove o passeio na Maria Fumaça trazem a magia de sonhar um tempo que não se viveu, mas que pertence a um período onde tudo era melhor. Efetivamente produz a idéia de um tempo que não flui mais, permanecendo imutável em um eterno presente. As experiências do hoje são a continuidade desta eternização do passado, fruto de um processo de recordação do que se pensou ser o real passado”.
“A estruturação dos “Caminhos de Pedra” – no interior do município de Bento Gonçalves – encaixa-se nessa busca contemporânea de trazer a vida o passado, como se o tempo não tivesse exercido sua misteriosa ação sobre a trajetória daqueles homens. Com clara intenção turística – o projeto foi idealizado e implementado pelo Hotel Dall’Onder, a partir de diversas parcerias – inclusive da região do Vêneto. O roteiro propõe – de acordo com fôlderes divulgativos – trazer à luz o vêneto rural do século XIX. Para esse intento, a rota – antiga ligação entre Bento Gonçalves e Farroupilha – sofreu um processo de restauração em diversas habitações que se encontravam em seu percurso. Procurava-se destacar o autêntico, mostrando como eram as edificações quando da chegada dos imigrantes e como esse Vêneto rural tinha permanecido intacto na região serrana”.
“A nostalgia de um tempo melhor que existiu no passado marca a sua positividade e segurança, pois se contrapõe a realidade do presente – sempre negativa – e a insegurança do futuro, o qual se apresenta etéreo. Essa realidade produz um mercado turístico que se propõe a vender emoções ao nostálgico, promovendo o reconhecimento deste lugar estranho que é o passado: 'Projeto Cultura' – como é denominado pelo Hotel Dall’Onder – visa instituir-se enquanto um museu vivo da imigração italiana”.
"Entende construir uma presentificação do passado – ou melhor – o seu renascimento, os ‘Caminhos de Pedra’ produzem um efeito de real e constituem-se em uma representação, em uma memória da imigração, engendrando em si uma dimensão criativa. O chamado 'Caminhos de Pedra', o qual buscava resgatar a história dos primeiros imigrantes italianos no Rio Grande do Sul, no intuito de “mostrar como era”, compõem-se de construções – muitas em pedra – que remontam ao período inicial do fluxo imigratório na região serrana, entre 1880 e 1900".
"Destacam-se algumas habitações do roteiro, como a casa Bertarello, a ferraria dos Ferri, a casa das massas e a cantina Strapazzon”.
“A casa Bertarello é um sobrado em pedra, com balcão frontal – com cantina – o qual reproduz a arquitetura da região montanhosa do norte italiano".
"A ferraria dos Ferri constitui-se de um pavilhão de madeira, com um moinho acoplado, o qual mantém instrumentos de trabalho que identificam as funções de ferreiro, na virada dos séculos XIX e XX” .
“Seguindo a rota, ainda na comunidade de São Pedro, tem-se a casa das massas, um sobrado em madeira – sem balcão e com cantina – que disponibiliza a venda de biscoitos e massas, apresentando instrumentos de produção caseira da pasta. No piso da cantina, tem-se uma pequena tecelagem, com produtos em lã e linha para venda. Por fim, a casa Strapazzon, uma habitação com um primeiro andar e um mezanino, toda em pedra, que é utilizada hoje como lugar de armazenamento de uma produção caseira de vinho e de derivados da uva, sendo lugar também de degustação”.
“Destaca-se que – particularmente nessas duas últimas casas mencionadas – faz parte da narrativa a vinculação com o passado. Na casa das massas entende-se essa ação forte da busca do autêntico, pois na fala do administrador e de outros membros da comunidade, a casa que existia antes do restauro foi refeita – aos moldes da original. Dessa forma, conta-se que a habitação originalmente possuía dois pisos além da cantina; porém, com o empobrecimento e diminuição da família, destruiu-se o piso superior, pois era oneroso mantê-lo”.
“Para o projeto, refez-se o segundo piso, praticamente destruindo o primeiro, pois as madeiras, como no original, deveriam ser inteiras. Cumpriu-se a meta – o tempo não passou e a habitação renasceu mais bem estruturada que quando foi construída pela primeira vez. Como em um efeito mimetizador, a estrutura arquitetônica passada surge como um duplo no presente – igual como havia sido em sua primeira edificação: o tempo parou!”
“Na cantina, antigamente último ponto do roteiro, menciona-se sempre – como ponto valorativo da construção – o fato de cenas do filme O Quatrilho terem sido rodadas em seu interior, pois ela refletia esse momento histórico. Como parte da construção imagética, a fala do demonstrador significa a habitação, informando que ela foi a moradia dos ‘nonos’ recém-chegados, permanecendo sempre com a família. Como em um roteiro museológico, haja vista que a proposta da estrada é um ‘museu vivo da imigração’, faz-se referência ao contexto, remarcando sempre o caráter de fidelidade às tradições italianas do vêneto rural do século XIX. Inclusive, são utilizados esses 'restos' dialetais como forma de produzir uma sensação de viagem temporal, possibilitando esse renascimento do passado”.
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