A rica história da participação de anarquistas e socialistas italianos nas lutas do movimento operário brasileiro renderam livros e mais livros editados no Brasil e na Itália, além de inúmeras teses d mestrado e doutorado. Uma busca na internet revela, por exemplo, a obra "Anarquismo, Estado, e pastoral do imigrante das disputas ideológicas pelo imigrante aos limites da ordem: o caso Idalina", livro de autoria de Wlaumir de Souza e editado pela Editora Unesp.
O autor debate a influência da Igreja na determinação do perfil do trabalhador que deveria ser aceito como imigrante. A interferência da Igreja nos rumos da imigração é analisada especialmente com base no caso dos Missionários de São Carlos), ordem criada em 1887 para dar assistência aos italianos que aqui vieram "fazer a América".
O livro analisa a passagem da mão-de-obra escrava para a livre, baseada
fundamentalmente na imigração italiana, subsidiada pelo Estado como parte de um projeto político-ideológico com a Igreja. O imigrante é representado e instrumentalizado como
agente de uma mentalidade conservadora, em detrimento da modernização cultural. No lado
oposto a essa estratégia encontram-se os anarquistas em luta contra a superstição,
denunciando a corrupção da Igreja. O embate entre essas forças - anarquistas, Estado e
Igreja -, na cooptação do imigrante, eclodiria na acusação de estupro e assassinato da
menor órfã Idalina pelo maior símbolo católico da pastoral do imigrante, Padre
Faustino, no orfanato Católico Cristóvão Colombo, na capital de São Paulo.
"A Editora assim apresenta o livro de Wlaumir de Souza, dando uma idéia da influência dos
“Anaquismo, Estado e pastoral do imigrante. Das disputas ideológicas pelo imigrante aos
limites da ordem: O Caso Idalina - texto originalmente apresentado como dissertação de
mestrado ao Departamento de História da UNESP de Franca (SP), com o título Fazer a
América. Da estabilidade do ideal à instabilidade do real - amplia e aprofunda análises
anteriores sobre a imigração italiana e o papel desempenhado, nesse processo, pelo
Estado, pela Igreja, pela classe dominante e por anarquistas, seja da Itália, seja do
Brasil, com destaque para a Congregação dos Missionários de São Carlos Barromeu,
fundada por Dom João Batista Scalabrini (1839-1905), Bispo de Piacenza. Os principais
agentes desse complexo empreendimento: por exemplo, o fundador da Congregação Carlista,
responsável pela pastoral do imigrante, bem como os principais missionários dessa
instituição no Brasil: os padres José Marchetti, Marcos Simone e Faustino Consoni, além
de Assunta Marchetti, irmã do Padre Marchetti e fundadora da Congregação das Irmãs
Missionárias de São Carlos Barromeu (scalabriniana) receberam o devido tratamento
analítico. Uma parte das publicações anteriores a este livro ressalta, em termos
apologéticos, os méritos da vida e obra dessas pessoas.
Outros escritos, sem dúvida,
avançaram apresentando uma abordagem mais analítica e objetiva, sem, entretanto,
considerar devidamente toda a problemática da imigração e do anarquismo. O trabalho de
Wlaumir Doniseti de Souza, sem desmerecer as qualidades dos agentes envolvidos, analisa
a obra scalabriniana numa abordagem científica, colocando-a no contexto estrutural e
conjuntural do fim do século XIX e inícios do XX.
Foi o processo de modernização da
Itália e do Brasil, nos parâmetros do sistema liberal e capitalista, que se apresentou
como fator propulsor da industrialização da Itália e das modificações na sua estrutura
agrária, forçando muitos italianos a abandonar sua pátria e procurar a sorte nas
Américas. O mesmo processo levou os países periféricos do sistema a substituir a mão-de-
obra escrava pela livre. A força de trabalho do imigrante se tornou insubstituível e
sempre mais necessária, para o caso do Brasil, na lavoura cafeeira de São Paulo.
Nesse
contexto coube à Igreja Católica um papel decisivo e complexo. Também a Igreja,
analogamente ao sistema econômico e à sociedade civil, passou, na Itália e no Brasil,
por um processo de desestruturação, em estreita conexão com as modificações
socioeconômicas. Desestruturava-se a Igreja tradicional e clericalista, mas nem por
isso teve fim a colaboração entre Igreja, Estado e classes dominantes. Ela apenas se
rearranjou. Wlaumir Doniseti apresenta nesta obra uma análise consciente, no que se
refere à teoria, e empiricamente fundamentada, na qual os diferentes elementos e forças
desse sistema aparecem numa recíproca interação e num ajustamento contínuo, em
detrimento de seus opositores, dentre os quais os anarquistas, representados aqui por
Edgard Leuenroth". (Augustin Wernet)
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