segunda-feira, 31 de maio de 2010

História ( 211) - "Far l'America (122)" - Imigração no Rio Grande do Sul nas memórias de Julio Lorenzoni (1)

Maria Catarina Chitolina Zanini, professora da Universidade Federal de Santa Maria, no trabalho "Um olhar antropológico sobre fatos e memórias da imigração italiana"  analisa trechos das memórias doimigrante  vêneto Julio Lorenzoni (1863–1934).

"A sociabilidade daqueles colonos era limitada às festas religiosas, à missa dominical, quando se reuniam na igreja e, em seguida, na bodega, na qual compravam artigos que não produziam para o sustento familiar. Ali também ficavam a par dos acontecimentos mais distantes e, algumas vezes, recebiam notícias da "patria lontana. Julio Lorenzoni narra que, em 1879, já possuindo ele seu cavalo, que era um símbolo de status, rumava para a sede de Silveira Martins. Lá, aos domingos, encontravam-se os colonos, e as casas comerciais enchiam-se de gente. Nelas, bebiam e comiam. Depois, iam fechar seus negócios e fazer compras. A maioria logo voltava para casa, outros, porém, ficavam para jogar a mora, jogar bochas, de modo que alguns retornavam a casa 'bem alegres' . Esse era um universo primordialmente masculino, pois as mulheres, depois da missa — quando iam — tinham que retornar a casa e cuidar da prole, dos animais e dos demais serviços domésticos.

História ( 210) - "Far l'America (121)" - Imigração no Rio Grande do Sul nas memórias de Julio Lorenzoni (1)

Julio Lorenzoni (1863–1934), nascido em Vila Raspa, partiu da Itália com sua família em 1877, aos 14 anos. As memórias desse imigrante vêneto que se fixou no Rio Grande do Sul foram traduzidas por sua filha, Arminda Lorenzoni Parreira e publicadas em 1975 quando do Centenário da Imigração Italiana no estado, sob o título Memórias de um imigrante italiano. Maria Catarina Chitolina Zanini, professora da Universidade Federal de Santa Maria, no trabalho "Um olhar antropológico sobre fatos e memórias da imigração italiana"  analisa trechos dessas memórias.

"Ao decidirem partir da Itália para o Brasil, aqueles indivíduos procuravam realizar seus rituais religiosos, uma vez que não sabiam, conforme relata Pozzobon (1997), a religião que era praticada na nova terra. Eram aconselhados a trazer uma garrafinha de água benta, e as crianças eram crismadas antes da partida. Igualmente, na manhã que precedia à despedida de suas localidades, uma missa era realizada a fim de que fizessem uma boa viagem.

Lorenzoni assegura que, durante os primeiros anos de colonização, 1878 e 1879, a única religião que conservaram os colonos era a do coração, pois não havia igrejas ou padres. Ele sentia falta de rituais religiosos que mantivessem "vivo e ardente aquele sentimento religioso" (1975:77) que haviam trazido da Itália. Conforme o autor, a educação religiosa se dava em casa, pelas mães, que procuravam educar seus filhos na religiosidade católica. Missa só havia de três em três meses. O sentimento daqueles migrantes era o de que, sem religião, afastavam-de da civilização: 'O nosso colono não podia conformar-se com esse estado de coisas: ter que morrer sem ter um padre perto que lhe desse os confortos da religião, a extrema-unção, etc.'

Em 1880, contudo, chegou o primeiro sacerdote a Silveira Martins, e os colonos, de acordo com Lorenzoni, trabalharam todos na construção da igreja. Após a chegada dos padres, foram esquecidos 'os dois longos anos passados no meio do mato, à semelhança de animais selvagens' . Segundo Santin (1986:13), a capela, o campanário e os sinos constituíram a essência de toda a vida e de todo o universo do imigrante italiano em sua nova pátria. A força desses elementos era aquela do mundo de origem e tê-los aqui, na terra estrangeira, representava a preservação de uma determinada cosmologia".