sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

História (231 ): Templos religiosos e imigração italiana em São Caetano do Sul (2)

No site da Fundação Pró- Memória (autarquia municipal) texto autoria do jornalista Alexandre Toler Russo, discorre sobre a construção de igrejas  São Caetano do Sul, obras ligadas diretamente a imigrantes italianos e descendentes.   
 
"O crescimento da população de São Caetano exigia a criação de um templo de maiores proporções. De fato, a igreja do Bairro da Fundação, construída pelos colonos, já não podia comportar o grande número de fiéis da cidade. Desse modo, em 1932 já estavam em andamento os trabalhos para a construção da Igreja Sagrada Família.Em 1936, o serviço estava terminado.

Os idealizadores da chamada Matriz Nova foram os padres José Tondim e Alexandre Grigolli. Erguer o templo só foi possível graças à colaboração dos cidadãos locais, das indústrias e do comércio. 
A conclusão das obras ocorreu na época em que padre Ézio Gislimberti comandava a paróquia. A decoração interna foi executada pelos pintores Pedro Gentili e Ulderico Gentili".

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

História (230 ): Templos religiosos e imigração italiana em São Caetano do Sul (1)


A questão da religiosidade sempre acompanhou a trajetória dos imigrantes italianos em terras brasileiras. Na cidade de São caetano do Sul (SP) não foi diferente, conforme relato encontrado no site da Fundação Pró- Memória (autarquia municipal), em texto de autoria do jornalista Alexandre Toler Russo.
 
"Em 1717, os monges beneditinos iniciaram a construção de uma capela dedicada a São Caetano. Ficava no mesmo lugar em que hoje se encontra a Paróquia São Caetano (Matriz Velha). Em 1772, profunda reforma foi empreendida, sendo instalados coro, capelamor, sacristia, torre e sino. Nos séculos XVIII e  XIX, missas eram rezadas, todos os domingos, para os moradores do Bairro de São Caetano e para os escravos da fazenda dos monges beneditinos.

Na capela também eram realizados sepultamentos. No final do século passado, os imigrantes italianos que vieram para o Núcleo Colonial de São Caetano depararam- se com o pequeno local de culto. Em 1883, demoliram a capela e construíram a igreja conhecida, hoje em dia, por Matriz Velha.

Matriz Velha em 1908


Até o ano de 1911, quando foi instalada a Paróquia de Santo André, os habitantes de São Caetano não dispunham de assistência religiosa satisfatória. A partir dessa data, contudo, o padre Luiz Capra, sempre aos domingos, passou a celebrar missas no templo erguido pelos colonos.

Em março de 1924, finalmente, foi constituída a Paróquia São Caetano, confiada aos padres estigmatinos. O primeiro vigário foi o padre João Batista Pelanda. O coadjutor era o padre Alexandre Grigolli. Em 1946, a igreja foi contemplada com um altar feito de mármore - trabalho de Garbarino Giácomo Filho".

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Italiani – O legado de Celeste De Nardi na colonização de São Caetano do Sul (2)



O pioneirismo dos De Nardi legou à cidade o chamado Palacete De Mardi, hoje sede do Museu Histórico Municipal de São Caetano do Sul, administrado pela  Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul , autarquia municipal criada  em junho de 1991, que em texto assinado pelo historiador Clovis Antonio Esteves resgata a história do casarão. 

" A família dos De Nardi residiu no Palacete por muitos anos. No espaçoso terreno havia um pomar com vários tipos de frutas e, na frente da casa, havia um jardim com muitas flores e um frondoso cipreste.

Ao lado deste jardim, havia uma capela com a imagem de São João Batista, aonde o padre vinha rezar o terço em determinadas épocas. Aos domingos, a família se reunia para o almoço ao redor de uma farta mesa, em que o patriarca recordava os momentos passados na Itália, e todos ouviam com muita atenção e interesse.

Em 1937, o Palacete De Nardi abrigou em seu espaço, que foi dividido, uma família oriunda de Minas Gerais, mais precisamente da cidade de Andradas. Esta família era formada pelo casal Gabriel Rosa Alves e Mariana Norberta de Souza e seus nove filhos.

A família De Nardi permaneceu no Palacete até 1940. Em seguida, o local foi vendido para a família Perrella, que morava  em frente. Depois, a residência acabou sendo uma padaria, e abrigou vários inquilinos, sendo inclusive sede de time de futebol, o América Futebol Clube, na década de 1950. Nos anos 1970, o imóvel já tinha sofrido várias modificações e se encontrava em total abandono.

No dia 9 de agosto de 1985, o prefeito Hermógenes Walter Braido, pelo decreto 4674/85, declara o referido imóvel de utilidade pública para fins de instalação do Museu Municipal. É iniciado o processo de restauração do imóvel, com a orientação técnica do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT), órgão público estadual. Após três anos de exaustivo trabalho, o Palacete De Nardi foi entregue em 29 de dezembro de 1988 para abrigar o Museu”.


Italiani – O legado de Celeste De Nardi na colonização de São Caetano do Sul (1)


A imigração italiana  na região de São Caetano do Sul (SP), a família De Nardi tem papel de destaque. O pioneirismo dos De Nardi é resgatado no site da Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul , autarquia municipal criada  em junho de 1991, em texto assinado pelo historiador Clovis Antonio Esteves.


“A família De Nardi chegou a São Caetano do Sul em 28 de julho de 1877, na primeira leva de imigrantes italianos vindos da província de Treviso, Itália. Tinha como patriarca Giovanni De Nardi, que recebeu o lote 24 do Núcleo Colonial, instituído pelo Governo Imperial com o objetivo de iniciar a colonização da Fazenda São Caetano, que até então pertencia aos monges beneditinos, substituindo o trabalho escravo por trabalho livre para obter maior desenvolvimento da região.

Celeste De Nardi, um dos filhos de Giovanni, recebeu o lote 23 do mesmo
Núcleo. Em 1880, casou-se com Lorenzina Gava, sendo este casamento o primeiro a ser registrado em São Caetano. Celeste e Lorenzina foram morar na casa de Giovanni De Nardi, que possuía uma olaria de fabricação de tijolos.

Celeste De Nardi havia aprendido o oficio de pedreiro já na distante Itália, e foi
ele que desenvolveu o trabalho de reforma da antiga capela dos beneditinos, logo no início do Núcleo Colonial. Mais tarde, começou a construir a sua casa, no lote
vizinho ao de seu pai; em 1896, quando terminou a obra, foi residir neste local. 

Esta casa com grandes cômodos tinha uma fachada suntuosa e uma arquitetura bastante arrojada, inspirada nos modelos de construções da Europa. Este padrão de residência não era comum naqueles tempos, e só as famílias mais abastadas podiam construir algo deste gabarito. Os tijolos empregados foram produzidos na olaria dos De Nardi.

Esta casa, que chamava a atenção pela sua grandiosidade, passou a ser chamada de Palacete De Nardi. Celeste De Nardi foi também quemdesenvolveu os trabalhos de construção da Matriz Velha, bem como de outros prédios  em São Caetano, como a sede da Sociedade de Mutuo Socorro Príncipe de Nápoli e a Cadeia Pública.

Logo que a família De Nardi foi morar no Palacete, um dos cômodos da
moradia foi cedido para abrigar a escola feminina, uma vez que as aulas estavam
sendo ministradas, provisoriamente, na igreja, já que as casas das antigas senzalas onde funcionavam as escolas da época, tanto feminina como masculina, haviam sido cedidas a moradores. Esta escola, que passou a ser denominada Primeira Escola Feminina, permaneceu no Palacete até a construção do primeiro prédio do grupo escolar".

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

História (229 ) – “Far l’America (134 )": Rivalidades regionais entre os imigrantes italianos na cidade de Campinas (2)

A pesquisadora Maria Lúcia de Souza RangelRicci, do Centro de Memória Unicamp, autora do artigo ”Conflitos D’Italianità e Ambigüidades das Diferentes Societàs em Campinas e seus Distritos de Sousas e Joaquim Egídio (SP)”, publicado no site da  Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica, assim descreve o associativismo regional dos imigrantes.


“(.... ) Os italianos que se fixaram em Campinas englobando dois de seus atuais Distritos - Sousas e Joaquim Egídio - procuraram se reunir por meio de associações que conservavam um cunho nitidamente regional, aliás, idéia corrente na Itália de fins do século XIX, quando o Estado há pouco formado, não havia ainda sobrepujado a noção de região (RIOS, l950). Predominaram as ligas e sociedades beneficentes, de mútuo socorro, com denominações patrióticas, onde os indivíduos cultivavam também as tradições e atavismos de sua terra natal; as festas que promoviam eram as que prevaleciam em suas regiões e não as do país que estavam habitando, as quais lhes eram indiferentes.
(...)Assim, onde estivessem algumas dezenas de peninsulares, logo surgiria uma associação que sempre manteve espírito individualista o que constituiu sério obstáculo para o florescimento e continuidade da maior parte das associações.
Com seus estandartes, bandeiras e com número variável de participantes, as associações italianas promoviam comemorações principalmente em suas datas nacionais (onde era indispensável a presença da banda musical).
Em Campinas, desde o final do século XIX várias sociedades foram formadas e, em 1883, foi fundada a XX de Setembre que além de bailes promovia piqueniques no Bosque das Caneleiras (hoje Jequitibás), além de festas típicas italianas.
Foi muito comentada pela imprensa campineira da época a festa promovida por esta Sociedade em julho de 1897, em homenagem à memória de Sadi Carnot, sendo que um grande baile teve lugar no Salão Vitória, o mais imponente da Campinas de então. Mas, a imprensa ainda deu vivo destaque à discussão havida durante a comemoração entre o presidente da XX de Setembre - Vito Zaccara - e Antônio Vignone, que conduzia a Famigliari Regina Margherita. O desentendimento, fruto da rivalidade existente entre ambas, foi decorrente de a Regina Margherita estar com saldo em sua conta menor que a XX de Setembre, além do número de sócios desta última associação ser maior.
Como se vê os motivos nem sempre eram relevantes e, com isto, as sociedades iam se enfraquecendo. Pouco tempo depois estas duas deixaram de existir, cedendo lugar a outras que se dedicaram principalmente à manutenção de escolas onde o prioritário era o ensino do italiano, mas sem deixar de lado a função assistencial”.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

História (228 ) – “Far l’America (133 )": Rivalidades regionais entre os imigrantes italianos na cidade de Campinas (1)


O caráter heterogêneo da imigração italiana no Brasil, marcado pela diferenças sócio-culturais dos pioneiros oriundos de diferentes regiões da Península Itálica, se refletiu, de imediato, na vida cotidiana, como demonstra a pesquisadora Maria Lúcia de Souza RangelRicci, do Centro de Memória Unicamp, autora do artigo ]”Conflitos D’Italianità e Ambigüidades das Diferentes Societàs em Campinas e seus Distritos de Sousas e Joaquim Egídio (SP)”, publicado no site da  Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica .
  
“Em 1874, encontramos em Campinas os primeiros italianos e já em l896 representavam eles quase o dobro das demais correntes imigratórias. Em l907, ocupavam o primeiro lugar no Estado de São Paulo nas estatísticas referentes à imigração.

A maioria dos imigrantes italianos chegou às regiões ora estudadas procedentes do Norte da Itália, contratado para o trabalho na lavoura do café embora sem ter especialização e nem mesmo ofício determinado e com família já constituída. Mas, todos vieram com seus seculares preconceitos regionais.

Não seria, pois, com indivíduos tão heterogêneos, com tendências de independência econômica, de enriquecimento, além de muitos almejarem logo voltar ao seu torrão natal, possível formar quadros fixos de operários permanentes em determinado ofício.

Com um pessoal que assim pensava, com um nacionalismo exacerbado, desprezando o país em que se encontravam, apontando como estigma as doenças tropicais, as pragas, os insetos, considerando inferiores negros, mulatos e caboclos vendo-os como vadios, dados à embriaguez, mal vestidos e alimentados, não seria possível se esperar deles nos primeiros momentos da chegada algum interesse proveitoso à vida brasileira.

(...) A crise cafeeira iniciada em l929 transformou a situação até então existente nas áreas paulistas: grandes latifúndios foram repartidos e até abandonados e os colonos puderam, com o que conseguiram amealhar, se transformarem em pequenos proprietários, formarem seus sítios com a família e, assim, se emanciparem.

Especificamente no caso de Campinas, considerando-se que constituíam um grande contingente, não tardou muito para que se envolvessem em algumas confusões, apesar de seu temperamento geralmente alegre, mas agitado. Assim, uma das primeiras que se tem notícia foi a 7 de abril de 1879 - a chamada Revolução dos Italianos - quando saíram às ruas, em grande arruaça e armados, unicamente, de... sapatos! Nunca se soube exatamente o porquê deste movimento; pelo que noticiou a imprensa da época poderia ter sido para obtenção de melhores salários nas fazendas e mais trabalho na zona urbana.
Foi este acontecimento o germe primeiro para a futura criação do Vice-Consulado na cidade a fim de que os problemas que por vezes surgiam mesmo fossem resolvidos através da autoridade competente”.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Italianitá– O jeito de ser italiano na literatura do modernismo brasileiro:as sátiras de Juó Bananére (4)


Bilac de armadura em ilustração de Voltolino
Em 1915, o poeta Olavo Biliac fazia uma visita a São Paulo no boljo da Campanha Civilista (iniciada por Rui Barbosa em 1910 opondo-se à candidatura presidencial do marechal Hermes da Fonseca) . As páginas da revista “O Pirralho” apoiavam os civilistas. Mas o cronista Juó Banaére, pseudônimo do poeta e jornalista Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, não poupava críticas irônicas a Bilac e, por ocasião da visita do “Príncipe dos poetas brasileiros” a São Paulo, publicava o artigo “O NAZIONALZIMO - A migna visita na Cademia di Cumerço du Braiz”. 

Após a publicação das críticas Bilac, Bananére deixaria de fazer do quando de cronista de “O Pirralho”, conforme anunciava a  própria revista  na edição seguinte: "Deixou de fazer parte desta revista o talentoso moço Alexandre Marcondes Machado, que sob o interessante pseudônimo de Juó de Bananére vinha ha muitos annos com as suas magníficas “Cartas d’Abaxo O´Piques” desopilando o fígado dos nossos leitores. Ao optimo companheiro os nossos agradecimentos com os melhores votos de felicidade".
Elias Thomé Saliba (Departamento. de História – USP), em artigo publicado na Revista de História ( n.137, São Paulo, dez. 1997) relembra e comenta esse episódio:

“Contra a maré de elogios e saudações públicas ao "príncipe dos poetas brasileiros", Juó Bananére escreveu uma impertinente paródia da presença de Olavo Bilac em São Paulo e, sobretudo, da famosa oração que o poeta pronunciou aos estudantes da Faculdade de Direito. Esta paródia foi publicada, um dia depois da festiva aparição de Bilac na Faculdade de Direito, na coluna de Bananére, em O Pirralho.
Bananére começa com uma notícia triunfal:‘A vesta do Bilacco - Quartaferra teve a nunciada visita du Bilacco, principe dus poeta brasileiro, o Dante nazionalo! Uh! Mamma mia, che sucesso! O saló stava xíinho di gente pindurado. Gada lustro apparicia un gaxo de banana di gente. Bilacco disse moltos suneto gotuba

.O problema é que a paródia envereda depois por lances mais delicados, por exemplo, quando o próprio Bananére se compara a Bilac: ‘Nom é só o Bilacco que é uleomo de lettera -(ío) també scrivo verso, ió també scrivo livro di poesies chi o Xiquigno vai inditá, i chi undia va vê si nom é migliore dus livros du Bilacco... ‘

Em seguida, o próprio Bananére aparece como convidado para uma ‘circunferenza na Gademia di Commerco du Braiz’; seu discurso, inteirinho em macarrônico, é uma paródia absolutamente anárquica da fala nacionalista de Bilac: 

‘Signori! Io stó intirigno impegnorato con ista magnifica rocepicó chi vuceio acaba di afazê inzima di mim. É moltas onra p'un pobri marqueiz! (tutto munnno grita: nó apuiado!) Io ê di si ricordá internamente, i con molta ingratidó distu die di oggi! I aóra mi permitano che io parli un pocco da golonia italiana in Zan Baolo, istu pidaçó du goraçó da Intalia, atirado porca sorte inzima distas praga merigana. É una golonia ingolossale! Maise di mezzo milió di italiano stó ajugado aqui, du Braiz, ó Buó Rittiro, i du Billezigno ó Bizigue! I chi faiz istu mundo di intaliano chi non toma gonta du Cumerçu, das Fabrica, da pullitica, du guvernimo - i non botta u Duche dus Abruzzo come prisidenti du Stá nu lugáro du Rodrigo Arveros?’

Finalmente, Bananére conclui sua arenga anárquica, parodiando a célebre retórica de Bilac. (Lembre-se, aqui, dos famosos reptos do discurso de Bilac, por exemplo, quando dizia: "O que se tem feito, o que se está fazendo, para a definitiva constituição da nacionalidade?"). Eis Bananére: 

‘I quali é consequenza diste relaxamento? É qui os intaliano aqui non manda nada quano puteva inveiz aguverná ista porcheria! Quale é a consequenza da bidicaçó da nostra forza i du nostro nacionalismo? É chi nasce una crianza, a máia é intaliana, o páio é intaliano e illo nasce é un gara di braziliano! Istu no podi ingontinuá, no! A voiz chi sono giovani i forte cumpette afazê a reaccó, cumbattê, vencê e dinuminá istu tudo! Tegno dito" - Rompi una brutta sarva di parma. Mi begiário, mi giugáro flor e mi liváro incarregado até o bondi inlétrico" (O Pirralho, 1915, p.9)’. 

Mas, na realidade não houve nem beijos nem abraços triunfais, pois a cidade e sua jovem elite intelectual, parece, não estavam para brincadeiras. Os estudantes da Faculdade de Direito, no dia seguinte dirigiram-se afoitos, em magotes, para uma manifestação em frente a redação d'O Pirralho - que então se localizava na rua XV de novembro, exigindo a demissão do jornalista e ameaçando empastelar o jornal. Bananére é então demitido, perdendo o seu lugar de "barbieri e giurnaliste" na sua famosa coluna "Diário do Abaixo Piques" (O Estado de São Paulo, 1915, p.7). Parecia claro que, à parte as desavenças pessoais que ajudavam a fermentar o conflito, o anarquismo lingüístico de Juó Bananére não se enquadrava facilmente em fórmulas e manifestos, que pediam um mínimo de clareza, renunciando a qualquer tipo de ambigüidade.O episódio é muito revelador dos compromissos que a jovem intelligentsia de São Paulo tinha com aquele nacionalismo algo difuso mas, que se nutria de uma única certeza: sua raiz paulista, ávida por construir e reforçar uma hegemonia e, se possível, estendê-la ao campo das letras e da cultura. 

Após a saída de O Pirralho, o cronista macarrônico chegou a escrever, a partir de 1916, muito esporadicamente nas revistas semanais O Queixoso e A Vespa. Na primeira, Marcondes Machado comparece com uma coluna intitulada "Sempr'avanti! - e na segunda revista, com a sua coluna "Cartas d'Abax'o Piques." Mas será em "O Queixoso", no final do ano de 1916, que Bananére irá detonar seu segundo desentendimento com o então jovem estreante nas letras, Oswald de Andrade”.

sábado, 25 de dezembro de 2010

História (227) - "Far l´America (132 )": Imigração e o desenvolvimento das colônias na Serra Gaúcha

“Uma gama de legislações, Provincial e Imperial, regulava a colonização das terras desocupadas, criando uma administração central em cada colônia. Um corpo funcional foi designado para a administração dos projetos de colonização e urbanização das áreas antes devolutas. A localização desta sede era escolhida em um lugar conveniente, que posteriormente se transformaria no centro do município. As primeiras instalações destas sedes (havia uma para cada uma das quatro colônias italianas) foram a casa da Comissão de Terras e Colonização, o Barracão para receber os imigrantes, um depósito de materiais e almoxarifado, o cemitério e as residências dos funcionários do governo. Posteriormente eram construídas uma igreja e uma escola (MACHADO e HERÉDIA, 2003). Logo estes núcleos foram sendo ampliados com a construção de mais moradias para os imigrantes que não se adequavam ou não queriam se dedicar às atividades agrícolas,surgindo assim os primeiros estabelecimentos de serviços, como oficinas, funilarias, botequins, casas de negócios etc.

Machado e Herédia (2003) apontam que no final do século XIX, toda a região dava sinais de prosperidade. Muitas pequenas indústrias já tinham sido instaladas. Em Caxias havia 65 moinhos, 41 serrarias, 35 alambiques, 27 ferrarias, 17 engenhos de cana, 9 curtumes, duasfunilarias, além de um sem números de outros estabelecimentos. Como resultado do crescimento econômico que as colônias vinham alcançando, em 1884 foram emancipadas as colônias de Caxias, Dona Isabel e Conde D’Eu, passando à condição de distritos. Apenas seis anos depois, em 1890, foi criado o município de Caxias, tendo por sede

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

História (226) – “Far l’America” (131): Vitivinicultura em Caxias do Sul nos primeiros tempos da grande imigração


Um relato do trabalho dos imigrantes italianos nas férteis terra da Serra Gaúcha pode ser conferido no texto de   de Cláudio Vinícius Silva Farias, do Programa de Pós-Graduação em Economia, Universidade do Vale do Sinos – UNISINOS. O título do artigo é “A indústria vitivinícola e o desenvolvimento regional no RS: uma abordagem neoinstitucionalista da imigração italiana aos dias atuais".


“Os primeiros colonos trouxeram consigo mudas de novas variedades de uvas, auxiliando no aperfeiçoamento da qualidade do vinho produzido na região.Passados as duas primeiras safras, que garantiram a subsistência dos colonos, começaram a surgir os primeiros excedentes dos produtos agrícolas e agroindustriais (ainda que de forma rudimentar), dando início a um comércio inter-regional e, logo a seguir, estadual e nacional, a despeito de todas as dificuldades logísticas existentes à época. 

Além dos produtos agrícolas tradicionais da subsistência colonial (milho, batata, trigo, arroz e feijão), as plantações de uvas se adaptaram muito bem ao clima (principalmente as do tipo Isabel), gerando os maiores excedentes entre os produtos da região. 

Em 1883, o cônsul italiano em Porto Alegre relatou: “a videira cresce de modo surpreendente. Já no segundo ano dá uva e no terceiro a colheita é abundante. Segundo afirmações de muitos colonos, foi precisamente esta riqueza agrícola que reteve os nossos imigrantes. Em Conde D’Eu produziu-se em 1881 aproximadamente 5.000 hectolitros de vinho. No presente ano espera-se obter o triplo” (COSTA et al, 1999)”.


quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Italianitá– O jeito de ser italiano na literatura do modernismo brasileiro:as sátiras de Juó Bananére (3)


Os textos no dialeto macarrônico criado por Juó Bananére (pseudônimo de Alexandre Marcondes Machado) ganharam fama na revista O Pirralho, a partir de 1911. Posteriormente foram reunidos no livro La Divina Increnca, cuja primeira edição data de 1924  (Irmãos Marrano, Editores).

O poema Migna Terra, por exemplo, brinca,  no macarronês de Bananére, com o famoso poema Canção do Exíio do poeta romântico Gonçalves Dias.



MIGNA TERRA  
(Juó Bananére)
Migna terra tê parmeras,
Che ganta inzima o sabiá,
As aves che stó aqui,
Tambê tuttos sabi gorgeá.
A abobora celestia tambê,
Chi tê lá na mia terra,
Tê moltos millió di strella
Chi non tê na Ingraterra.
Os rios lá sô maise grandi
Dus rio di tuttas naçó;
I os matto si perdi di vista,
Nu meio da imensidó.
Na migna terra tê parmeras,
Dove ganta a galligna dangolla;
Na migna terra tê o Vapr’elli,
Chi só anda di gartolla.

Canção do Exílio

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
 

Análise acadêmica
No site da Unicamp, uma das mais renomadas Universidades do Brasil, Cesar Augusto de Oliveira Casella analisa o poema Migna Terra no texto “La Divina Insgugliambaçó ou ‘como se lê um poema em português macarrônico

“Migna Terra’ não é apenas uma paródia cômica do poema de Gonçalves Dias, mas um canto paralelo, pois ao mesmo tempo em que ironiza seus aspectos ufanistas e patrioteiros, presentifica o tema, atualizando-o para uma nova situação. Através do conflito operativo de dois idiomas, o italiano e o português, e sua resultante na invenção de uma nova linguagem, traz à tona um momento histórico diverso daquele cantado pelo poema romântico”, analisa Cristiana Fonseca. Além deste aspecto histórico e social, e para além também do aspecto literário e estético, podemos trabalhar o imbróglio de idiomas de que se serve o autor. A oralidade subjacente à escrita de Juó é evidente. Pode-se ouvir um imigrante italiano que veio, ignorante e esperançoso, trabalhar braçalmente no Brasil, ou melhor, nas lavouras de café do interior paulista, território bem conhecido pelo engenheiro Alexandre Machado, e que por um motivo ou outro, acabou encravado em um bairro de imigração italiana na cidade de São Paulo.

Temos a mistura explicita e gráfica dos idiomas em galligna, em dove, em tuttas, em moltos. Temos índices da suposta ignorância, atribuída aos imigrantes ítalo-paulistanos, em abobora celestia substituindo abobada celestial, em maise grandi no lugar de maior. Temos aspectos ligados a sonoridade em abobora, que não possui o acento para que haja uma maior aproximação com o idioma italiano, em tê e em tambê, quando o final é alterado para se aproximar foneticamente do linguajar italianado”.  

Italaini - Ottone Zorlini: arte e polêmica


Autor do polêmico monumento Travessia do Atlântico, Ottone Zorlini (Treviso Itália 1891 - São Paulo SP 1967) é assim descrito no verbete da  Enciclopédia Itaú Cultural

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“Pintor, escultor, desenhista e ceramista. Inicia sua trajetória profissional, aos 13 anos de idade, quando começa a trabalhar em uma fábrica de cerâmica. Muda-se para Veneza, onde em 1906, cursa a Academia de Belas-Artes e freqüenta os ateliês do escultor Umberto Feltrin e do ceramista Cacciapuoti. Nessa cidade, executa retratos e monumentos funerários, por volta de 1919. Em 1927, vem para o Brasil, onde realiza o Monumento aos Heróis da Travessia do Atlântico no ano seguinte. Passa a conviver com os pintores Mario Zanini, Francisco Rebolo e Alfredo Volpi, integrantes do Grupo Santa Helena, em São Paulo

Com esses artistas, viaja constantemente pelos arredores do litoral paulista, entre 1936 a 1943. Além dessas atividades, participa da formação do Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo. De 1959 a 1963 dedica-se a escultura elaborando bustos e obras fúnebres”.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Cultura - A polêmica escultura da Travessia do Atlântico (3)


Após 25 anos, o  monumento Heróis da  Travessia do Atlântico, neste mês de dezembrro de 2010, voltou para seu lugar de origem: as margens da Represa de Guarapiranga (Zona Sul da Cidade de São Paulo) Obra do escultor ítalo-brasileiro Ottone Zorlini foi inaugurada em 1929, por iniciativa da Sociedade Dante Alighieri, como homenagem aos aviadores italianos Francesco De Pinedo e Carlo Del Prete, que dois anos antes (mas já cinco anos depois dos portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral), a bordo do Savoia-Marchetti S.55, haviam feito uma das travessias aéreas pioneiras do Atlântico Sul, bem como ao brasileiro João Ribeiro de Barros, que, pouco tempo depois, ainda no ano de 1927, realizou a mesma façanha, a bordo do hidroavião Jahú.
Os mais jovens talvez não saibam que a obra de arte, que nos últimos 25 anos esteve na Avenida Brasil, foi durante muitos anos um marco do Distrito do Socorro e registra um dos fatos mais importantes da aviação brasileira, a travessia d Oceano Atlântico nos anos 20. Um verdadeiro feito para o início do século passado.
Em 1987, o então prefeito Jânio Quadros determinou que o monumento fosse movido para os Jardins, para ser protegido de uma série de depredações que vinha sofrendo, onde permaneceu até meados deste ano. Neste seu retorno ele ficará dentro do parque municipal da Barragem que é cercado e será iluminado, além de ficar exatamente em frente a um Distrito Policial, tudo isto para evitar que ele venha a sofrer qualquer dano no futuro.

Cultura - A polêmica escultura da Travessia do Atlântico (2)


“O monumento aos “Heróis da Travessia do Atlântico” (obra de Ottone Zorlini -Treviso, Itália, 1891 – São Paulo, 1967), sofreu vários danos exposto a céu aberto em São Paulo. Durante a Segunda Guerra Mundial, os feixes de bronze foram retirados e recolocados tempos depois. Detalhes decorativos de bronze que adornavam a coluna foram furtados, assim como as placas de bronze, com inscrições em italiano, repostas em mais de uma ocasião.

Em 1985, o Instituto Cultural Umbro-Toscano de São Paulo solicitou a readequação do local de implantação do monumento à Prefeitura. A entidade temia pela integridade da obra, instalada num ponto em que a avenida De Pinedo forma um ângulo de 90 graus, com intenso tráfego de ônibus e caminhões. Julgando que o monumento estava “escondido” em Santo Amaro, o prefeito Jânio Quadros determinou sua transferência, em 1987, para a praça Nossa Senhora do Brasil.

O fato, abordado exaustivamente pela imprensa, causou muita polêmica. Na praça, a obra foi pichada várias vezes, em manifestações de repúdio ao regime fascista e a Benito Mussolini. Esquecia-se que o monumento presta justa homenagem a um feito louvável para a época e expressa as ideologias presentes no momento de sua concepção e implantação”. (Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo)

Cultura - A polêmica escultura da Travessia do Atlântico (1)


Mesmo antes de sua concepção, o monumento "Heróis da Travessia do Atlântico"- recolocado neste mês de dezembro de 2010 no seu lugar de origem, às margens da Represa de Guarapiranga,(zona Sul da cidade de São Paulo) - causou polêmica por estar associado à figura de Benito Mussolini. A Prefeitura de São Paulo, relembra como é que o monumento foi concebido. 
 


"Uma comissão de imigrantes italianos encaminhou à Câmara Municipal, em 1924, um pedido de licença para construir um monumento em homenagem a Benito Mussolini numa das praças de São Paulo. Mussolini, primeiro-ministro da Itália entre 1922 e 1943, era líder do movimento nacional-imperialista daquele país, conhecido como “fascista”. O pedido foi debatido pelos vereadores, mas logo ultrapassou o recinto da Câmara, provocando manifestações de vários segmentos da sociedade. Dada a reação, o projeto foi abandonado. Dois anos depois, no entanto, a idéia foi retomada, mas a oposição a ela continuava tão viva quanto sua defesa e, mais uma vez, o projeto ficou em suspenso.

Pouco tempo depois, o general Francesco De Pinedo, o piloto Carlo Del Prete e o mecânico Vitale Zachetti, todos italianos, atravessaram o Atlântico a bordo do hidroavião Savóia 55 “Santa Maria” e amerissaram na represa do Guarapiranga no dia 28 de fevereiro de 1927. Uma multidão os aguardava, composta, sobretudo, por italianos aqui radicados e seus descendentes. No dia 1º de agosto do mesmo ano, João Ribeiro de Barros realizou a mesma façanha, a bordo do hidroavião Jaú. A Light & Power Company teve de colocar bondes extras para atender aos populares que acorriam à represa saudar o aviador brasileiro. A Sociedade Dante Alighieri propôs a construção de um monumento “aos heróis da travessia do Atlântico”, junto à barragem do Guarapiranga e próximo ao local das amerissagens, no então município de Santo Amaro.

Para celebrar a aventura de seus compatriotas, Mussolini enviou a São Paulo uma coluna, com capitel em estilo jônico, retirada de uma construção milenar recém-descoberta no monte Capitólio, em Roma. A coluna foi incorporada ao monumento, inaugurado no dia 21 de agosto de 1929. Em declaração à imprensa, Ottone Zorlini (Treviso, Itália, 1891 – São Paulo, 1967), autor da obra, falou sobre o seu significado: “A junção ideal da época da Roma antiga às modernas conquistas que renovam e perpetuam a grandeza do passado, constitui a concepção geral da obra”.

No topo de um alto pedestal, uma escultura de bronze, chamada de “Vitória Alada”, lembra o sonho de Ícaro e aponta na direção do oceano. Na face frontal do pedestal, estrelas de bronze compõem a constelação do Cruzeiro do Sul. Nas laterais, encontram-se dois fascios. Um deles tem a esfera celeste e a inscrição “Ordem e Progresso” da bandeira brasileira; o outro, o símbolo de Roma: uma loba alimentando os irmãos Rômulo e Remo. A coluna romana está engastada na parte inferior do pedestal. A altura total do monumento é de cerca de 9 metros.
Fascio e machadinha: simbologia fascista

O fascio – feixe de varas transportado por antigos oficiais romanos, junto com uma machadinha, quando acompanhavam os magistrados – era um símbolo utilizado na Antiga Roma para expressar a idéia de que, uma vez unidos, os homens não poderiam ser vencidos. O fascio foi resgatado por Mussolini e transformado em símbolo do fascismo.

Mussolini tinha interesses estratégicos nos vôos pioneiros dos aviadores italianos e estudava o estabelecimento de pontos de apoio para sua frota aérea. Chamava De Pinedo de “Senhor das distâncias” e o acompanhou na definição do itinerário da viagem pelo Atlântico e pelas Duas Américas. O hidroavião Savóia 55 foi batizado com o nome de uma das caravelas de Colombo, a “Santa Maria”, lembrando assim a descoberta da América pelo navegador genovês. A travessia do Atlântico, maior desafio da viagem, foi feita em linha reta entre Bolama, na Guiné Portuguesa (atual Guiné-Bissau), e Natal, no Rio Grande do Norte, seguindo depois pela costa brasileira até Buenos Aires. De Buenos Aires, os italianos cruzaram a América do Sul pelo interior do continente, seguindo os rios Paraná, Paraguai, passando por Manaus, Cuba, e alcançando a América do Norte. A travessia do Atlântico Norte foi feita em linha reta, de Terranova, no Canadá, à Ilha dos Açores".

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Italiani - A aventura de Ferrarin e Del Prete nos céus da Itália e do Brasil

Em 2009, a Fundação Rampa, com sede em Natal (Rio Grande do Norte), publica o livro “Cavaleiros do Céu: a saga do vôo de Ferrarin e Del Prete, de autoria dos pesquisadores Frederico Nicolau e Rostand Medeiros. A façanha concluída em 5 de julho de 1928 (com pouso em Natal) celebrizou os italianos Arturo Ferrarin e Carlo Del Prete.

"Os italianos voaram sobre o mar em uma aeronave que não utilizava flutuadores, que possuía grande parte de sua estrutura em madeira, a uma velocidade média de 170 km/h, sem maiores recursos tecnológicos, com apenas um pequeno rádio transmissor, que, entretanto não tinha sistema de recepção, deixando-os surdos em relação ao que acontecia ao seu redor. Ferrarin e Del Prete enfrentaram tempestades fortíssimas. Eles seguiram uma rota que não se distanciava muito da mesma utilizada pelo recente e fatídico vôo AF-447 da Air France, mas conseguiram superar as massas de nuvens que quase comprometeram o “raid” e foram os primeiros aviadores a completarem sem escalas a ligação aérea entre a Europa e a América do Sul.

Enquanto isso, em uma chuvosa Natal, a expectativa era enorme. Operadores das estações de rádio da Marinha e da firma Wharton Pedroza, aguardavam algum sinal em código Morse. O governador da época, Juvenal Lamartine de Faria, já havia preparado toda uma estrutura de apoio aos tripulantes do Savoia-Marchetti S.64 e o então distante Campo de Parnamirim, permanecia iluminado por fogueiras. Na manhã de cinco de julho, após visualizarem a costa brasileira, os maravilhados italianos transmitem uma mensagem informando da chegada. Após circularem em meio a pesadas nuvens durante quase quatro horas, sobrevoaram a capital potiguar, onde observam seus habitantes acenando entusiasticamente. Entretanto eles não encontraram uma ferrovia que indicaria o caminho para o Campo de Parnamirim. 


Buscaram algum local propício para pousarem ao longo da costa litorânea ao norte de Natal e, já sem gasolina, aterrissaram com sucesso nas areias de uma lagoa seca, próximo a beira-mar, de onde podiam avistar a apenas dois quilômetros, uma pequena vila chamada Touros. Este feito assombrou a todos, mostrando a um mundo, que, em grande parte ainda utilizava a tração animal como principal meio de transporte, as enormes vantagens da aviação. Seu ato colocou definitivamente o Rio Grande do Norte, com a sua vantajosa posição geográfica, nos mapas daqueles que desenvolviam este novo meio de transporte”.  (Tribuna do Norte)

Italianitá– O jeito de ser italiano na literatura do modernismo brasileiro:as sátiras de Juó Bananére (2)


No ano em que nascia Juó Bananére (1911), o Brasil era governado por um militar, o marechal Hermes da Fonseca. A ação política do periódico “O Pirrallho” foi extremamente crítica em relação ao governo do marechal.  E tal crítica se sustentava no humor e na ironia de Bananére.
Artigo publicado por Sérgio Amaral Silva no site Digestivo Cultural faz menção à crítica política de Juó Banaére.

Seu alvo preferencial, o presidente da República entre 1910 e 1914, marechal Hermes da Fonseca (que tratava por "Maresciallo", "Hermese" ou "Dudú"), a quem não poupava também a noiva, a caricaturista Nair de Teffé (a "Nairia"). Ironizava ainda a eminência parda do governo, o político gaúcho Pinheiro Machado (o "Pignêro"). Essas três personagens aparecem no poema O Dudú, que no trecho final os denuncia como responsáveis pelo desvio de dinheiro público:

"O Maresciallo co'a Nairia i co Pignêro
Azuláro cos dignêro
Gá du Banco da Naçô.
I un restigno che scapô distu pissoalo
O ermó du Maresciallo
Passô a mó, abafô !

I o Brasile goitado !
Ficô pilado, pilado !!..."

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Italianitá– O jeito de ser italiano na literatura do modernismo brasileiro:as sátiras de Juó Bananére (1)


Alexandre Machado
A imigração italiana e a italianidade de uma São Paulo em grande  transformação urbana, foram, nas primeiras décadas do século XX, fontes de inspiração para dois jovens escritores do Modernismo no Brasil: Alexandre Ribeiro Machado, que se firmou com pseudônimo Juó Bananére, e Alcântara Machado.Ambos autores deixaram um precioso legado, até hoje tema de estudos sócio-linguinticos em Faculdades e Universidades: um retrato do jeito de ser, e sobretudo de falar, dos italianos que se fixaram na capital paulista.
 
A sátira de Bananére
 
No dia  11 de abril de 1892, nascia na cidade Pindamonhangaba, interior de São Paulo, Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, filho de José Francisco Ribeiro Marcondes Machado e de Mariana Machado. Em 1895, com a morte de José Francisco, a viúva partiria rumo a  Araraquara (interior paulista)  Paulo, levando consigo seus oito filhos. Mais tarde os Machado seguiriam para Campinas ondeAlexandre completaria o ensino secundário.

Em 1911, com residência fixada em São Paulo e matriculado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, um novo tempo se abriria na vida desse jovem estudante, com sua participação na revista “O Pirralho”. E é na Pirralho que surge a figura de Juó Bananére, pseudônimo que Alexandre Machado optou para atuar como cronista  no periódico fundado por Oswald de Andrade. 

Quem abriu espaço para o nascimento de Bananére foi o próprio Oswald, que, sob o pseudônimo de Annibale Scipione,  publicava na revista crônicas no estilo macarrônico. 
Vários estudos e artigos produzidos no meio acadêmico brasileiro analisam a importância do gênero literário de Juó Banaére e suas implicações sociológicas e linguítsicas.

Ao comentar a caricatura de Bananére, criada por Voltolino (pseudônimo do ilustrador oriundo Lemmo Lenni ),Benedito Antunes (professor de Literatura Brasileira da Unesp, Câmpus de Assis, e autor de Juó Bananére: As Cartas d’Abax’o Pigues, São Paulo, Editora Unesp, 1998), lembra que “sua figura tem traços mais populares e cômicos do que a de seu antecessor (Anibale):cabeleira desgrenhada, nos bigodões em ponta e nas pernas arqueadas, como na casaca, no chapéu, na impagável bengala e no cachimbo fumarento que o acompanham. Passa a representar, dessa forma, o imigrante italiano mais pobre, que ocupava grande parte dos bairros populares da capital paulista, na figura daqueles que habitavam a Baixada do Piques’.

Benedito Antunes defende que tal representação deve ser avaliada dentro do contexto social de uma São Paulo repleta de imigrantes, cidadãos sujeitos ás mais diversas formas de preconceitos, entre elas  em grande número, e espalhados em bairros como Brás e Bexiga, os italianos, naturalmente, eram alvo preferencial dessa sátira  imigrante italiano "Pode ser que Oswald de Andrade, ao criar a coluna no semanário, não tenha ido muito além de uma intenção humorística semelhante à exploração mais corrente da situação do imigrante, que consistia em imitar o linguajar ouvido nos bairros populares do Brás, Bixiga, Bom Retiro, Barra Funda, Piques. 

Alexandre Machado, por sua vez, foi consolidando uma perspectiva um pouco diferente, fazendo com que a figura de Bananére desperte interesse ainda hoje, independentemente de sua motivação original. Isto porque logrou superar a imitação um tanto preconceituosa do linguajar dos forasteiros e atingiu um nível de criação textual que pode ser caracterizado como literário. Em outras palavras, foi como se, superando o macarrônico enquanto incapacidade de falar bem determinada língua, tivesse alcançado um nível superior de macarrônico, que poderia ser designado por gênero macarrônico. Aqui reside, a meu ver, o grande diferencial do fenômeno Bananére, que lhe garante sobrevivência e eventual incorporação definitiva ao cânone da literatura brasileira"
.  

Oriundi – As caricaturas de Lemmo Lemmi (2)


Na Revista Cult, Djalma Cavalcante (antropólogo, foi professor na Universidade de Roma "La Sapienza",   e coordenador da Comissão Organizadora do Centenário do Nascimento de Alcântara Machado, o escritor modernista autor de Brás, Bexiga e Barra Funda) fala sobre o talento do ilustrador Voltolino, pseudônimo do oriundo Lemmo Lemmi.

'Um ilustrador que exerceu significativa influência sobre António de Alcântara Machado foi Voltolino (nome artístico de Lemmo Lemmi, paulistano, filho de imigrantes italianos, nascido em 1884 e falecido em 1926). Tal influência era reconhecida conscientemente por António, ao ponto de a dedicatória do Brás, Bexiga e Barra Funda ter sido dirigida à memória do desenhista e de o primeiro artigo da coluna Saxofone, no Jornal do Comércio de São Paulo de 4 de setembro de 1926 ter tido Voltolino como tema. Vejamos trechos desse artigo:
       
’Para mim o que há de melhor na obra deixada por Voltolino é a fixação do ítalo-paulista. Fixação humorística. Triste também. Voltolino inspirava-se no ambiente. Daí o seu mérito. Foi o caricaturista deste momento inapreciável que a gente vive. Lápis desgracioso, o seu. Deselegante como ele só. Por isso mesmo caricaturava melhor os humildes. ... Com dois traços apanhava o tipo em flagrante. O desenho era apressado mas seguro... Sua obra nasceu toda de momento. Suas caricaturas eram sempre provocadas. O assunto surgia sem ser buscado. Assim muito naturalmente: na rua, no noticiário dos jornais, nos acontecimentos do dia. O desenho tinha relação com o instante em que aparecia. Datava sempre um fato. Marcava um tipo ocasional. Comentava. Sublinhava. ... Sob certo aspecto continuou Angelo Agostini. Ele em São Paulo e J. Carlos no Rio ficarão sendo os ilustradores de sua época. ... Os caricaturistas brasileiros imitando os seus patrícios pintores têm se dedicado quase que exclusivamente à interpretação do negro e do caboclo. ... Voltolino enriqueceu a galeria com mais um tipo: o ítalo-paulista. Criou o Juó Bananere. Ou melhor: a família de Juó Bananere. ... Eu o via passar todas as noites quase madrugada sozinho, o olhar meio injetado, o passo meio incerto. Hora suja das varredeiras da Limpeza Pública. Hora úmida da garoa. Hora dos automóveis farristas. Hora do guarda noturno de capotão e porrete. (Horas que Voltolino amava e eu amava nos desenhos dele) Seu vulto comprido agigantava-se na bruma. Depois era um borrão. Depois nada’.
           
Voltolino influenciou António por dois caminhos: pela maneira como desenhava e através de sua máxima criação, ou seja, Juó Bananere, o personagem pelo qual Alexandre Marcondes Machado parodiava a colônia italiana de São Paulo.
      
O desenho simples e sintético de Voltolino tinha a espontaneidade de uma piada e essa característica foi o principal ponto de contato entre a sua linguagem gráfica e a linguagem literária de António.
     
Lendo a obra jornalística ou ficcional de António de Alcântara Machado, percebemos que, em certa medida, ao falar de Voltolino, está falando de si mesmo. As características e as qualidades que ele aponta para o ilustrador são idênticas às suas. António em São Paulo e João do Rio no Rio de Janeiro foram os cronistas de sua época da mesma forma que Voltolino e J. Carlos o foram na caricatura.
     
Voltolino nunca desenhou para os escritos de Antonio, mas inspirou-os. O mesmo foco de atenção (os bairros humildes, os tipos corriqueiros e, principalmente, os ítalo-paulistas) e o mesmo traço sintético e preciso caracterizam a obra de ambos. Voltolino desenhando propunha todo um discurso verbal. António escrevendo nos propunha um filme subliminar' ".

Oriundi - As caricaturas de Lemmo Lemmi (1)


Juó Bananere
O ano era 1911 e nas páginas da revista “O Pirralho” (fundada por um jovem que viria a ser um dos ícones do Modernismo no Brasil, Oswald de Andrade), o cronista Juó Bananére (pseudônimo do jovem estudante de engenharia, Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, de 19 anos) faria a sua estréia substituindo Annibale Scipione (pseudônimo do próprio Oswald), que publicava crônicas no estilo macarrônico. 

O textos de Bananére foram associados a uma caricatura criada por  Voltolino, pseudônimo de João Paulo Lemmo Lemmi (1884 -1926), paulistano, filho de imigrantes italianos.

“Com trabalhos publicados em diversas revistas e jornais, inclusive para a imprensa de língua italiana de São Paulo, os desenhos de Voltolino traduzem o ambiente urbano da Primeira República paulistana.

O caricaturista viveu e frequentou preferencialmente o triângulo das Ruas Direita, São Bento e XV de Novembro no centro de São Paulo, onde se localizavam as redações dos principais jornais e revistas para os quais trabalhava. A partir do centro, Voltolino desenhava com espontaneidade a caricatura da nascente sociedade proletária urbana e o correspondente ambiente industrial dos bairros da Barra Funda, Pari, Brás, Belenzinho, Móoca e Vila Prudente”. (Memória Fundap).


Segundo Ana Maria Belluzzo, no livro Voltolino e as Raízes do Modernismo, o personagem baseou-se em um tipo real da época: "Foi Francisco Jacheo, conhecido humorista, inseparável de Voltolino, que usava o nome de dom Ciccio, quem inspirou a criação de Juó
Bananére"

Verbete da Enciclopédia Itaú Cultural recupera texto de Herman Lima (História da caricatura no Brasil, 3º Volume III. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1963. p.1238-1239) que assim descreve Lemmo Lemmi.


'Um dos desenhistas de humor mais importantes e atuantes da imprensa paulistana em expansão no início do século XX, João Paulo Lemmo Lemmi, apesar de filho de imigrantes italianos, declarava-se paulistano da gema. Filho do artesão Ernesto Lemmi, aos 12 anos é levado a Pisa, Itália, para completar seus estudos técnicos. De volta ao Brasil, se dedica à caricatura de forma autodidata, tendo colaborado com alguns jornais locais na Itália.

É na imprensa paulistana de língua italiana que encontra espaço para iniciar sua carreira por volta de 1905. Em jornais como Cara Dura: il giornale piu stupido del mondo,1 Il Grilo di Flora e Il Pasquino Coloniale, Voltolino consolida os principais traços de seu trabalho: de teor combativo, seu desenho satírico coloca-se a serviço dos problemas sociais e políticos de seu tempo. Como ítalo-paulistano, a figura do imigrante e seu processo de aculturação na nova cidade tornam-se os temas mais freqüentes do artista, ao lado dos efeitos da industrialização nascente no âmbito do espaço urbano e as agruras do cotidiano dos seus novos agentes sociais, como o operariado e a pequena burguesia comercial, sem esquecer da velha oligarquia e da igreja. Dá vida gráfica a Juó Bananére, personagem e pseudônimo literário de Alexandre Marcondes Machado (1892 -1933), tipo ítalo-paulista criado em 1911 para expressar a mistura das duas culturas através da linguagem falada e escrita.

É somente com sua participação na revista carioca O Malho, entre 1908 e 1909, que seu nome torna-se mais conhecido. Contudo, o reconhecimento nacional de Voltolino é consolidado por sua colaboração na revista O Pirralho, entre 1911 e 1917, na qual chega a publicar 20 desenhos por edição, inclusive diversas capas. A publicação, fundada por Oswald de Andrade (1890 - 1954) e Dolor de Brito, dedica-se ao mesmo tempo à crônica mundana, ao comentário político e à crítica da vida cultural de São Paulo, e  e é considerada por historiadores "o balão-de-ensaio" do modernismo de 22.

Em sua redação, Voltolino trava contato com as polêmicas artísticas de seu tempo ao trabalhar com os artistas Di Cavalcanti (1897 - 1976), Ferrignac (1892 -
1958), Guilherme de Almeida (1890 - 1969) e, naturalmente, o próprio Oswald. Por outro lado, reconhece-se que suas charges e ilustrações são responsáveis pela crítica política mais vigorosa da revista, sendo impossível, como observa o crítico Sérgio Milliet (1898 - 1966), "entender o início do século XX paulista sem os desenhos de Voltolino do Pirralho".

Seus desenhos são conhecidos pela audácia, pelo traçado ágil, nervoso e despreocupado, em que o efeito cômico é atingido mediante um grande poder de síntese, no qual a economia gráfica se destaca. A determinação do risco e rapidez da execução dão organicidade a seus personagens. Voltolino desenha-os primeiro a lápis para depois, já totalmente decidido, finalizá-los com contorno a nanquim. 

Com relação às cores, gosta de usar as puras e intensas, usualmente trabalhadas em contraste. Salvo quando precisa desenhar em papel couché, em que utiliza a aguada em nanquim e a aquarela, suas cores são saturadas. A linguagem teatral e sua coleção de gestos humanos, a animalização das personagens, os trocadilhos visuais e verbais, a ironia, o disfarce e o simbolismo são típicos de Voltolino. Contudo, deve-se notar que seu humor não é agressivo, ao contrário, por vezes é complacente, principalmente com o imigrante italiano, pelo qual nutre uma relação de afeto. 

Na verdade, soube distinguir em suas charges aqueles que "fizeram a América", e lutavam por reconhecimento social no Brasil às vezes de forma ridícula, dos que não conseguiram chegar lá. Em 1914, passa a contribuir para uma nova revista, A Cigarra, conhecida por seu cuidado com a qualidade gráfica. Também colabora com outras revistas importantes como a D. Quixote, Revista do Brasil, Panoplia, O Parafuso, O Queixoso, O Sacy. Voltolino trabalha também como ilustrador de anúncios e cartazes, além da ilustração de livros. É responsável
pelas ilustrações coloridas da primeira edição de A Menina do Narizinho Arrebitado (1920) e Marquês de Rabicó (1922), ambos de Monteiro Lobato (1882 - 1948)”.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Cultura: la mangiatoia napoletana di San Paolo


‘Una rappresentazione di uno dei simboli universali della nascita di Gesù e un'opera d'arte composta da oltre 1.620 pezzi del secolo XVIII, epoca del regno di Carlo III a Napoli. E' il Presepe Napoletano di San Paolo, paragonabile solamente a quelli che si trovano nei musei San Martino di Napoli e al Metropolitan Museum di New York. 

Il presepe fu comprato in Italia nel 1949 dal Conte Ciccillo Matarazzo Sobrinho, nipote del Conte Francesco Matarazzo, nato a Castellabate nel 1854 e arrivato in Brasile nel 1881. Fu esposto a San Paolo per la prima volta il 4 ottobre del 1950 nella Galleria Prestes Maia, restando in esposizione per 11 mesi all'anno. Oggi è visitabile in uno spazio espositivo permanente, attiguo al Museu da Arte Sacra di San Paolo, in una cappella costruita nel 1908.
La sua scenografia riproduce con fedeltà il paesaggio napoletano, con figure ed accessori realizzati in terracotta e legno. La ricomposizione delle figure venne realizzata dall'artigiano italiano Gregorio Tinelli, l'ambientazione scenografica da Tullio Costa con la collaborazione di Italo Bianchi.
 
Cercando di mantenere una tradizione dell'epoca, vennero costruite le miniature delle case in mattoni, circondate da stradine e piazze tipiche del borgo napoletano del secolo XVIII e da marciapiedi realizzati con piccolissime pietre. Nell'insieme, rappresentato da diverse scene di vita quotidiana, si differenzia solo la rappresentazione della nascita di Gesù, con la Sacra Famiglia circondata da angeli, arcangeli e cherubini’.

Cultura: A manjedoura napolitana em São Paulo



Uma representação de um dos símbolos universais do nascimento de Jesus e uma obra de arte de mais de 1.620 peças do século XVIII, época do reinado de Carlos III em Nápoles. Este é o Presépio Napolitano de São Paulo, somente comparável aos conjuntos que estão nos museus San Martino (Napoli) e Metropolitano (Nova Iorque). Baseada em pesquisas e montagens anteriores, sua nova cenografia reproduz com fidelidade a paisagem napolitana, permitindo que figuras e acessórios - feitas de terracota e madeira e esculpidas -  ganhem vida e movimento em sua riqueza de detalhes e expressões.

O presépio chegou ao País pelas mãos do herdeiro do conde Francesco Matarazzo,  Francisco Matarazzo Sobrinho, o Ciccillo, em 1949. A recomposição das figuras foi realizada pelo artesão italiano Gregório Tinelli e a ambientação cenográfica por Tullio Costa com a colaboração de Ítalo Bianchi, que mantendo uma tradição da época construíram as miniaturas das casas tijolo por tijolo, cobertas com telhas verdadeiras fabricadas especialmente para a montagem. As vielas e as praças do cenário representando uma vila napolitana do século XVIII idealizada também foram calçadas com pequenas pedras colocadas uma a uma. 

Em 4 de outubro de 1950, dia de São Francisco de Assis - considerado o precursor da arte dos presépios -, o Presépio Napolitano foi, finalmente, aberto à visitação pública na Galeria Prestes Maia - atual filial do Masp-, permanecendo em exposição por 11 meses. Sua desmontagem, mesmo com o sucesso de público, ocorreu quando da instalação da escada rolante na galeria. O acervo foi, então, embalado e transferido por cinco anos para a Metalúrgica Matarazzo. 

O prestígio de Ciccillo Matarazzo, membro da Comissão do IV Centenário de São Paulo, favoreceu que a Prefeitura Municipal recebesse em 1956 a doação do acervo, transferido para o antigo Pavilhão do Folclore na grande marquise do Parque Ibirapuera. Estava garantida a preservação do conjunto napolitano e lançada a semente para o futuro Museu de Presépios, que somente em 2 de abril de 1969 seria oficialmente inaugurado pelo prefeito Faria Lima. Em outubro do ano seguinte, a coleção foi doada ao Governo do Estado de São Paulo, permanecendo no Parque Ibirapuera até dezembro de 1985, quando o acervo, pelas péssimas condições ambientais e técnicas do local, foi transferido para o Mosteiro da Luz, sede do Museu de Arte Sacra. 

Após 50 anos de sua aquisição por Ciccillo Matarazzo, o valioso presépio passou a contar com um espaço expositivo permanente. A antiga residência do capelão, contígua ao atual Museu de Arte Sacra e construída em 1908, foi integralmente reformada pela Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, propiciando um ambiente museológico adequado e a correta instalação do acervo, a partir de critérios de preservação e conservação.
A Restauração - A montagem atual, que contou com a colaboração do historiador napolitano arte Luciano Migliaccio, professor na Universidade de São Paulo. Seguindo a concepção do presépio como um conjunto unitário, manteve as características principais desenvolvidas por Tullio Costa na década de 50, baseando-se também em referências da arquitetura das vilas da Itália meridional e em pinturas napolitanas do século XVIII. Análises técnicas, no entanto, revelaram a inadequação de alguns elementos do antigo cenário, que incluía produtos não recomendados para a conservação do acervo devido à volatização de produtos químicos e liberação de compostos nocivos que aceleravam a degradação das peças do conjunto. 

Com a impossibilidade de reutilização do cenário anterior, iniciaram-se, em janeiro de 1998, os trabalhos de uma nova cenografia, com materiais de caráter inerte e baixos índices de emissão ou migração de componentes prejudiciais. A partir da catalogação e medição de cada peça do conjunto, foi executada uma maquete volumétrica para visualização espacial dos núcleos cenográficos e compatibilidade de escala de seus elementos.
O suporte das montagens anteriores, construído em madeira e infectado por cupins, também foi abandonado. A nova estrutura metálica é composta por módulos fixos e móveis, permitindo o acesso de técnicos para manutenção das peças, isolada do espaço de circulação do público por um vidro. Este isolamento atende às exigências de monitoramento ambiental (temperatura, umidade, poluentes) conforme as normas de conservação e mantém condições de segurança do acervo. 

O Presépio, além de representar uma obra de arte de grande raridade, constitui-se em importante testemunho histórico e antropológico da sociedade napolitana do século XVIII. O conjunto, com um total de 1620 peças, é formado por 445 figuras humanas, com grande parte conservando suas roupas originais, que reproduzem com exatidão as vestimentas das diferentes classes sociais e dos diferentes povoados do reino de Napoli no período.
A técnica de confecção das imagens, que variam de dez a 50 centímetros, permite que possam ser movimentadas e colocadas em conjuntos variados. O corpo dos pequenos manequins é formado por armação de arame envolto em fios de estopa. A cabeça e as extremidades são modeladas em terracota ou esculpidas em madeira. 

No conjunto, apresentado por cenas integradas, destaca-se o nascimento de Jesus, com a Sagrada Família envolvida por anjos, arcanjos e querubins. Animando a chegada do cortejo dos Magos, nove músicos e acessórios são distribuídos no início da escada da ruína romana.
O Cortejo, uma das cenas mais ricas, apresenta árabes, indianos, chineses, etíopes, pigmeus, caucasianos, tártaros e negros. No Chafariz aparecem camponesas, provincianas e vendedores ambulantes. 

Na cena da Casa Rica, retrata-se o momento da ceia, com a mesa guarnecida de toalha de renda e bordados, baixela de prata e porcelana. A animação da festa é representada pela "tarantella", dança típica que envolve nove figuras.
O esplendor do Presépio se completa com as cenas ligadas ao trabalho cotidiano do vilarejo. Dezenas de acessórios, animais e figuras representam as atividades do ferreiro, sapateiro, barbeiro, verdureiro, entre outras.

sábado, 18 de dezembro de 2010

História (225) – Imigração trentina e o papel da Igreja (2)

O trabalho “Igreja e italianidade: Rio Grande do Sul (1875-1945)”, produzido por Paulo César Possamai (DH/FFLCH/USP ), dá destaque ao clero italiano que acompanhou a imigração trentina no brasil.



A presença de um sacerdote entre os imigrantes dava-lhes um sentimento de segurança e de bênção ao movimento emigratório, aumentando a identificação entre o campesinato e o baixo clero. Contudo, o mesmo sentimento não se repetia com relação ao alto clero, que identificava-se com as classes dominantes. Quando o bispo de Crema, na província de Cremona, pediu aos presentes à missa que pensassem seriamente sobre a decisão de emigrar, exortando os fiéis a não desesperarem-se, um após outro, os camponeses abandonaram a igreja de Cascine Gandine, deixando o bispo só. Para esses camponeses, seduzidos pelo sonho de fare l'America, o bispo estava a serviço dos patrões (VILLA, 1993, p. 81). 

Entre os agentes de emigração encontrava-se um padre, que da central de recrutamento no Canal do Brenta, próximo a Bassano, havia enviado ao Brasil, em 1877, mais de dois mil camponeses vênetos. A maioria deles seguiu com destino ao Paraná (VILLA, 1993, p. 75). A escolha de um sacerdote para o cargo de agente de imigração certamente tinha como objetivo aproveitar a confiança que os camponeses depositavam no clero, sentindo-se assim, mais seguros para tomar a difícil decisão de emigrar para um país estranho'.

História (224) – Imigração trentina e o papel da Igreja (1)



O êxodo de trentinos rumo ao Brasil tem ligação direta com a ação de padres italianos, conforme mostra o trabalho ““Igreja e italianidade: Rio Grande do Sul (1875-1945)”, produzido por Paulo César Possamai (DH/FFLCH/USP ).

"Embora as causas que originaram o fenômeno da emigração em massa na Itália da segunda metade do século XIX estejam principalmente ligadas a fatores econômicos, também é muito importante salientar a influência que a luta entre o Estado e a Igreja Católica tiveram na decisão de emigrar de muitos camponeses, fortemente marcados pelo conservadorismo e pelo espírito clerical.

A maioria dos imigrantes italianos que se instalou no Rio Grande do Sul, a partir de 1875, provinha das regiões italianas do Vêneto, Lombardia e Friuli e ainda do Trentino onde, pelo fato de pertencer aos domínios da Casa de Habsburgo, apesar da maioria da população ser étnica e culturalmente italiana, o movimento emigratório assumiu características próprias com relação à emigração italiana propriamente dita.

Do século XI até 1805, quando foi cedido à Baviera por Napoleão, Trento foi uma cidade-livre do Sacro Império Romano-Germânico, governada por príncipes-bispos. A maioria da população trentina era composta de camponeses (cerca de 90% da população total), cujo caráter pragmático se preocupava mais com a cobrança das taxas e impostos e com o número de soldados requisitados pelo governo do que com a nacionalidade dos governantes. 

Por isso uma das raras rebeliões ocorridas no Trentino aconteceu em 1809, quando o governo bávaro tentou impor a conscrição obrigatória à toda a população masculina da região. A revolta logo recebeu o apoio da Áustria, que ambicionava anexar a província rebelde. A situação foi controlada por Napoleão, que, através do Tratado de Paris, de 1810, transferiu o domínio político do Trentino, da Baviera para o reino napoleônico da Itália.

Com a derrota de Napoleão, a Áustria ocupou a região em 07 de abril de 1815, data marcada pela visita do imperador Francisco I a Trento. Em 1816, o principado de Trento foi anexado à província austríaca do Tirol, passando desde então a chamar-se oficialmente "Tirol Meridional", numa clara tentativa de assimilação, já que o Tirol é uma região caracteristicamente germânica. Naturalmente, essa atitude do governo austríaco provocou descontentamento na população que, em 1848, enviou a Viena um abaixoassinado pedindo autonomia administrativa para o Trentino. 

O governo austríaco não só ignorou o pedido como, em 1854, proibiu o uso do nome "Trentino" que, a partir de então deveria ser substituído por "Tirol Meridional" ou "Tirol Italiano" (GROSSELLI, 1986, p. 22-28).

Contudo, a luta nacionalista pela unificação do Trentino à Itália era uma preocupação marcadamente burguesa e citadina, já que os camponeses não engajaram-se na luta. O conservadorismo e o clericalismo eram as bases da sociedade trentina, majoritariamente camponesa, por isso a ocupação de Roma em 1870 significou a falta de apoio popular à unificação com a Itália, acusada de usurpar os domínios temporais do Papa. 

O jornal católico "Voce Cattolica" assim definiu o liberalismo em 16.09.1870: "Il liberalismo, come vedemmo, altro non è in sostanza che la ribellione sistematizzata a Dio Creatore e Redentore nell'ordine naturale e soprannaturale; altro non vuole, che la scristianizzazione dell'individuo, della famiglia e della società, e la distruzione della Chiesa Cattolica" (apud GROSSELLI, 1986, p. 33). 

Essa posição anti-liberal do clero e, por sua influência, da maior parte da população do Trentino, marcou os imigrantes trentinos no Brasil, onde faziam questão de diferenciar-se dos "italianos" como "tiroleses", não tanto por nacionalismo austríaco ou fidelidade à Casa d'Áustria mas, sim por não pertencer a um país condenado pela Igreja pelo seu liberalismo anti-clerical. De fato, a Igreja Católica foi para o campesinato trentino, como também para o italiano, o que o Estado nacional foi para a burguesia emergente e o que foram os sindicatos e os partidos políticos para o proletariado urbano. Na Igreja se formavam os quadros dirigentes do campesinato, para o qual o padre não era somente um sacerdote, mas também um líder intelectual.

A moral camponesa era a moral católica e a verdadeira autoridade reconhecida por essa grande parcela da população era o clero (GROSSELLI, 1986, p. 142).
A emigração em massa não se explica, pois, somente pela fuga à pobreza e, por vezes, à miséria em que viviam os camponeses italianos e trentinos. Sob a liderança do clero, os emigrantes buscavam reconstruir na América uma sociedade que passava por profundas transformações na Europa em conseqüência do avanço das idéias liberais e socialistas, da urbanização crescente, da industrialização e do militarismo (GROSSELLI, 1986, p. 145-154). A fim de fugir da nova ordem, uma parte do clero acalentou o ideal de reconstruir no Novo Mundo uma sociedade camponesa e clerical. Um sacerdote da província italiana de Treviso chegou a afirmar "que estando a religião em decadência na Itália, justificava-se emigrar para a América a fim de aí estabelecer-se uma colônia piedosa" (DORE, apud AZEVEDO, 1975, p. 63).
A emigração em busca de trabalho em países vizinhos já era tradicional entre os habitantes do norte da Itália e do Trentino, porém, com a chegada dos agentes de imigração às aldeias italianas retratando os países americanos como um verdadeiro Éden, surgiu uma verdadeira "febre americana" entre os camponeses italianos. A emigração desse período não foi um fenômeno individual, mas de grupo, e, se esse verdadeiro êxodo se desenvolveu num clima relativamente pacífico, isso foi devido à influência do clero, que procurou evitar o surgimento de tensões entre as classes sociais no momento da partida, que, por vezes se assemelhava a uma grande procissão, quando os emigrantes seguiam o caminho para o porto de embarque acompanhados pelo som dos sinos, precedidos por um cruz ou o estandarte de um santo (VILLA, 1986, p. 75-76). 

Nesses grupos de emigrantes partia tanta gente que, por vezes, a inteira população de uma aldeia decidia emigrar em conjunto, situação dramática que levou muitos párocos a aderir e mesmo liderar o movimento emigratório. Entre os padres que acompanharam grupos de emigrantes encontramos o padre trentino Bartolomeu Tiecher que, em 1875, partiu rumo ao Brasil na companhia de um grupo de 208 imigrantes italianos e 392 trentinos, entre os quais se encontravam seus pais e irmãos. Chegando ao Rio Grande do Sul, o padre Tiecher foi nomeado pelo governo imperial capelão da Colônia de Santa Maria da Soledade do Farromeco. Em 1886 tornou-se vigário da recém-criada paróquia de Garibaldi (RUBERT, 1977, p. 47-50). 

O padre Domenico Munari, pároco de Fastro, diocese de Pádua, ofereceu-se para emigrar junto com seus paroquianos e, em 1876, partiu com um grupo de 275 imigrantes italianos que embarcaram em Bordéus, na França, rumo ao Brasil. Apesar do navio em que viajavam ter naufragado próximo a La Rochelle, ele e seu grupo retomaram a viagem ao Rio Grande do Sul, onde Munari estabeleceu-se como o primeiro pároco de Bento Gonçalves (RUBERT, 1977, p. 51-53)”.