domingo, 14 de fevereiro de 2010

Oriunidi - Sangue italiano nas veias do Modernismo brasileiro: a escultura de Brecheret

O escultor Victor Brecheret tem um papel diferenciado e fundamental no Modernismo Brasileiro: junto com Anita Malfatti e Lasar Segall, é figura importante do período 'heróico', constituindo os antecedentes da Semana de 22, que se caracterizam pelos acontecimentos mais importantes na formação inicial do grupo modernista.

Além disso, se destaca nos anos 20 e 30 como artista da escola de Paris e nas décadas de 40 e 50 no cenário artístico de São Paulo, com monumen-tos públicos, funerários e decorativos de fachadas, como o 'Monumento às Bandeiras', hoje um dos símbolos da cidade.

O local de seu nascimento é assunto que gera confusão. Boa parte de textos referentes aos artistas informam que ele era italiano natural de Farnese (região Lazio), tendo nascido nessa cidade a 22 de fevereiro de 1894 e registrado com o nome de Vittorio Brechetet. No entanto, sua filha Sandra Brecheret Pellegrini mostra no site dedicado ao escultor que seu pai era mesmo brasileiro, natural de São Paulo, onde nasceu em 22 de fevereiro de 1894, filho de Augusto Brecheret e Paulina Nanni Brechret.

Em 1912 inicia seus estudos em desenho, modelagem e entalhe em madeira no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. Parte para Europa em 1913, com intenção de estudar escultura em Roma, tem como mestre Arturo Dazzi. Em 1919 retorna ao Brasil e monta um ateliê no Palácio das Indústrias, nessa época conhece modernistas como Di Cavalcanti, Hélios Seelinger, Oswald de Andrade e Menotti Del Picchia. Em 1921, com uma bolsa de estudos de cinco anos, vai a Paris. Esta estadia se estende por quase quinze anos, com vindas esporádicas ao Brasil para expor seus trabalhos.

Em Paris participa de vários salões, convivendo intensamente com artistas como Fernand Léger, Picasso, Archipenko, além de brasileiros como Anita, Tarsila do Amaral, Vicente do Rego Monteiro e Antônio Gomide - seu vizinho de ateliê. No Brasil, mesmo ausente, doze obras suas são expostas na Semana de Arte Moderna em 1922. Nos anos 30, participa intensamente da vida artística no Brasil, como sócio fundador da SPAM - Sociedade Pró Arte Moderna e nos Salões de Maio ( 37, 38 e 39 ), quando já havia voltado definitivamente para São Paulo para realizar o 'Monumento às Bandeiras'.

Na década de 40, ganha o concurso de outro monumento público, em homenagem à Duque de Caxias. Nesta época introduz elementos brasileiros em sua obra, interessado na arte indígena. As peças escultóricas aproximam-se da abstração, formas essenciais, primitivas, com um torneado rústico, caracterizando a fase de maturidade do artista - esculturas quase abstratas em suas deformações e encadeamento orgânico de volumes. Foi consagrado o melhor escultor nacional na I Bienal de São Paulo, em 51 e, após a sua morte em 55, a IV Bienal dedicou-lhe sala especial. (Fonte: Museu Arte Contemporânea USP e Portal do Governo do Estado de São Paulo)

História (73 ) – “Far l´America (41 ): o que faziam os imigrantes italianos na área urbana de São Carlos

Marili Peres Junqueira  docente da Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia traça , no artigo  Comércio e Imigração Italiana: uma estreita relação na cidade de São Carlos/SP/Brasil (1880-1900), um panorama da presença italiana na área urbana da cidade de São Carlos, interior de São Paulo no final do século XIX e começo do XX. 


"Ao chegarem num momento de transição, isto é, quando a escravidão entra em crise e se recorre ao trabalho livre, os imigrantes conseguem inserir-se num contexto urbano ainda magmático, que oferece possibilidades de empregos em fase de gestação e de definição, e, portanto, ainda não aproveitadas pelos poucos trabalhadores locais. Em todos os setores do trabalho urbano, por longo tempo, prevalecerá uma situação de monopólio por parte dos estrangeiros. (TRENTO, 1989, p. 127)”.

“A presença do imigrante italiano no comércio de São Carlos é marcadamente percebida pelo grande número de casas comerciais de propriedade de italianos12. Primeiramente os italianos dirigiram-se para o comércio ambulante; ao se estabelecerem nas cidades, os mascates abriam uma lojinha, de preferência de gêneros alimentícios, de armarinhos ou de artigos diversos13. Em 1894, São Carlos contava com 19 mascates sendo destes dez italianos, com 44 armazéns de fazendas dos quais 35 eram de italianos, com 32 armazéns de ferragens e tintas dos quais 18 eram de italianos. Em 1916-1917, São Carlos contava com dez lojas de fazenda, armarinhos, chapéus, roupas feitas, etc. destas quatro eram de propriedades de italianos” Segundo Trento (1989), além do setor comercial, o mundo do trabalho urbano oferecia outras possibilidades de inserção ao imigrante italiano, principalmente às camadas mais baixas".

"Os italianos eram numerosos entre os barbeiros, sapateiros, alfaiates, cocheiros, carregadores, marmoristas, marceneiros, ferreiros, entre outros. Em São Carlos, segundo os dados do Almanaque de 1894, os imigrantes italianos ocupavam preferentemente as seguintes profissões: alfaiataria (93,75%), barbeiros (76,92%), cocheiros (66,67%), ferreiros e serralheiros (60%), marceneiros e carpinteiros (66,67%), marmorista (100%) e sapateiro (91,18%)".

"Em 1916-1917, basicamente todos os alfaiates, ferreiros, sapateiros da cidade eram italianos. Segundo Trento (1989), era no setor de subemprego e das atividades marginais que se encontrava o monopólio dos imigrantes italianos. Os engraxates, aguadeiros, vendedores de peixe, castanhas assadas e os vendedores de jornais representavam “um exército de italianos”.

História (72 ) – “Far l´America (40 ): imigrantes italianos na área urbana de São Carlos, interior de São Paulo

No artigo http://www.economia.unam.mx/cladhe/registro/ponencias/471_abstract.pdf   docente Marili Peres Junqueira (Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia) mostra a relação entre a grande imigração para o Brasil do final do século XIX e o comércio urbano exercido por imigrantes, principalmente italianos, na constituição e formação de uma cidade no Oeste Cafeeiro Paulista, no caso São Carlos.

"Os imigrantes que viviam no mundo urbano, em geral são pouco enfatizados pela historiografia que trata do tema e do período serão os atores principais desse trabalho. A historiografia sobre a imigração italiana tem focalizado especialmente o mundo rural, especialmente também o fluxo de imigrantes italianos que se dirigiu para a lavoura cafeeira e, portanto, enfatiza muito mais a experiência rural", “O censo realizado pelo Club da Lavoura de São Carlos, em 1899, mostra o número total e a nacionalidade dos trabalhadores rurais. O total de trabalhadores rurais levantado foi de 24.320 pessoas, destes eram efetivamente ativos 15.688. Os italianos perfaziam o maior número daqueles ativos, 10.396, seguidos pelos espanhóis (1.356), brasileiros negros (1.242), brasileiros brancos (1.028), portugueses (886), austríacos (447), alemães (211), polacos (119), franceses (3.) Os dados revelam a importância dos imigrantes italianos para o município de São Carlos, especialmente no mundo rural onde constituíam 66,27% da mão-de-obra rural ativa”.

“Contrariamente à política nacional de imigração destinada a atrair imigrantes para o trabalho somente nas lavouras de café, muitos iam para as cidades montar pequenos negócios. Algumas vezes alcançavam êxito com seus negócios e se tornavam industriais. Mas como mostra Dean (1971), eles tinham poucas possibilidades de elevarem-se acima da classe inferior, quando muito chegavam ao nível do comércio varejista ou das oficinas mecânicas. Aqueles imigrantes que conseguiam igualar-se aos fazendeiros em posição social eram de origem totalmente diversa da maioria”.

“A razão mais óbvia, segundo Dean, da preponderância de imigrantes nas atividades comerciais, muito embora não explique sua tendência para a manufatura, é a ausência, quase que completa de um quadro de paulistas com um estilo urbano de vida. A própria vinda dos imigrantes através das companhias de navegação favoreceu o contato com o meio urbano, pois eles passavam dias alojados nas cidades, principalmente em São Paulo, ouvindo narrativas pouco favoráveis do mundo rural”.

Oriunidi -Sangue italiano nas veias do Modernismo brasileiro: prosa e verso de Menotti Del Picchia (2)

Nilce Camila de Carvalho (Universidade Estadual de Londrina) é autora do texto “ Da ‘Semana de Arte Moderna’ à ‘Semana Juca Mulato’ ” que traz reflexões sobre o poema Juca Mulato, escrito em 1917 por Menotti Del Picchia e publicado naquele mesmo ano num pequeno jornal da cidade de Itapira, interior de São Paulo.

"Juca Mulato conta a história de um triste caboclo que se apaixonou pela filha da patroa. Seu drama é o amor, e mesmo este possui uma significação social, uma vez que o eu-lírico é obrigado por uma imposição social a 'matar' esse amor que lhe nasceu na alma porque sua impossível correspondente pertence a um grupo social mais elevado".

"O drama do personagem é universal. O tema amoroso é a estrutura semântica de todo o poema, e no contexto em que é trabalhado traz informações sobre a sociedade hierárquica e economicamente instituída".

"O amor de Juca é platônico, o personagem tem consciência da impossibilidade de seus sonhos, ou seja, sua concepção de sociedade fundamentase a partir do conhecimento dessa hierarquia. Seus sentimentos não podem ser respondidos devido à posição que o Mulato ocupa nessa sociedade estratificada, em que inicialmente tem-se a complicada relação entre patrão e empregado, que geralmente requer uma série de comportamentos e hábitos, como o modo de se vestir, alimentar, falar, oriundas de certa diferenciação social, que acabam por relegar o Mulato à margem; seguidamente, outro fator aglutinador da diferença entre o caboclo e sua amada é a própria questão 'racial', muito em voga na época em que o poema foi escrito, e que assim condena Juca a escória da sociedade".

"Como poema nacionalista, no sentido de ser um canto em homenagem à terra, Juca Mulato pode ser também considerado regionalista, na medida que apresenta um caboclo nascido num determinado local e a relacionar-se profundamente com seu ambiente".

Oriunidi - Sangue italiano no Modernismo brasileiro: prosa e verso de Menotti Del Picchia (1)



Na célebre Semana de Arte Moderna de 1922, caberia ao poeta e romancista Paulo Menotti Del Picchia, filho do jornalista italiano Luigi Del Picchia e Corina Del Corso, coordenar a segunda noite do evento. Nascido em São Paulo, em 1892 iniciou seus estudos no interior. Em 1906 muda-se para Pouso Alegre, Minas Gerais, onde estudou no Ginásio Diocesano São José. Em 1909 seguiria para São Paulo onde cursou Diretiro na Faculdade do Largo São Francisco. O ano de 1913 marcaria a estréia de Del Picchia no mundo literário com o livro Poemas do Vício e da Virtude. Em Itapira (São Paulo) entra para o mundo jornalístico dirigindo os jornais Diário de Itapira e O Grito.

Em 1917 publica o sua mais importante obra, o poema Juca Mulato. Participa da Semana de Arte Moderna, em 1922, e coordena a segunda noite do evento. Nela fez um discurso expondo os ideais da nova literatura. “"Queremos luz, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações obreiras, idealismos, motores, chaminé de fábricas, sangue, velocidade, sonho, na nossa Arte E que o rufo de um automóvel, nos trilhos de dois versos, espante da poesia o último deus homérico, que ficou, anacronicamente, a dormir e sonhar, na era do "jazz-band" e do cinema, com a flauta dos pastores da Arcádia e os seios divinos de Helena! " Nessa mesma noite rceitou poemas e versos em prosa.

Oriundi - Sangue italiano nas veias do Modernismo brasileiro: a obra de Anita Malfatti (2)

“Após a polêmica exposição de 1917, Anita Malfati vive um clima de sofrimento; até o tio que financiou seus estudos no exterior quis destruir uma das telas a bengaladas. Heroína, lutou contra todos, tendo a seu lado apenas um fiel defensor e sua paixão nem tão secreta assim: Mário de Andrade, que morreu 19 anos antes de Anita, sem nunca dar a definição amorosa que ela tanto queria.

Após a Semana de 22, apresenta Tarsila do Amaral aos modernistas Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti del Picchia; formam o "grupo dos cinco" e estão constantemente juntos. Em 1923, ganha o Pensionato Artístico do Estado de São Paulo e vai para Paris, onde encontraria com Tarsila e Oswald, Victor Brecheret, Paulo Prado e Di Cavalcanti. Anita vive então uma transformação profunda, perde o impulso marcante do expressionismo, deixa de lado o uso de cores violentas e artificiais e começa a representar o mundo de forma mais simples.

Volta para São Paulo em 1928, reencontra os modernistas e participa das últimas manifestações do grupo. Nos anos 30, grandes dificuldades econômicas a obrigam a dedicar-se cada vez mais ao ensino da pintura e do desenho, e à pintura decorativa. Mas é no retrato, agora sem deformações, que deixa sua contribuição mais permanente. Aproxima-se da Família Artística Paulista, participando de todas as coletivas do grupo. Os amigos cobrariam o fato de Anita não ter seguido Tarsila no movimento Pau-Brasil. Nos anos 40, Anita visita Belo Horizonte e cidades históricas mineiras. O que ela passa a expor então, são as festas, as procissões, ainda ao lado de retratos e flores, que vão ficando raros. Nos anos 50 - até sua morte, em 1964 - vive muito distante das polêmicas artísticas, recolhida em seu sítio. Segundo suas próprias palavras "Tomei a liberdade de pintar a meu modo."