segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Gastronomia - Polenta e italianidade

Ao concluir o curso de Antropologia na Universidade de Brasília, Júlia Dalla Costa, entregou uma monografia final que tinha como tema a relação entre italianidade e um dos pratos típicos da cozinha italiana: a polenta. Um resumo dessa pesquisa foi publicado no site Slow Food Brasil.Confira a análise da antropóloga.



  • “Entre os italianos que migraram para o Brasil, a polenta destaca-se como alimento característico de grupos familiares provenientes de regiões rurais do Vêneto. A polenta manteve-se como alimento de base entre colonos descendentes de imigrantes da região Sul do Brasil. Feita a partir de farinha de milho (originário das Américas), a polenta permaneceu como alimento cotidiano das famílias camponesas de origem italiana. A receita básica de polenta utiliza fubá, água e sal, sendo consumida cozida, na chapa ou frita. A cozinha do imigrante italiano originário do Vêneto era, portanto, baseada na polenta, consumida diariamente e acompanhada por outros alimentos produzidos pela própria família"

  • A localização das colônias italianas no Rio Grande do Sul, bem como sua organização social e as dificuldades de transporte, configuravam sua cozinha como sendo basicamente de subsistência, ou seja: comia-se o que era produzido. Durante minha pesquisa, realizada junto a um determinado grupo familiar de descendentes de imigrantes italianos, percebi, nas falas dos familiares de diferentes gerações, o lugar central ocupado pela polenta, não só entre os mais antigos, mas também nas novas gerações. Mas o valor atribuído a esse alimento é diferente para cada geração. Para entender a variação do valor da polenta, primeiro precisamos entender os elementos que influenciaram essa mudança". 

  • "Em minha análise, percebi essa alteração de significado em três momentos. Ainda, é importante ter presente que as mudanças de significado da polenta ao longo das gerações não ocorrem em substituição ao significado anterior, mas sim adicionando novos conceitos aos já antigos, que passam a compor um novo cenário, conjugado com o anterior. Assim, como vimos anteriormente, num primeiro momento a polenta vem da Itália para o interior do Rio Grande do Sul e permanece na mesa do imigrante italiano como alimento de base, que dá força para o trabalho diário na lavoura. Para essa primeira geração, a subsistência é a principal característica, assim como as relações próximas com vizinhos e familiares. Aqui a polenta é um alimento cotidiano, forte".

  • "O segundo momento é marcado pela saída da geração seguinte das pequenas colônias em direção a outros locais, onde havia possibilidade de maiores áreas de terras por menores preços. Na família analisada, isso ocorreu com a ida a estados mais ao norte do País, como o Mato Grosso, na década de 1970. A saída das colônias colocou esses descendentes de imigrantes em novos contextos étnicos, políticos e sociais. Esse contato provocou também alterações na culinária familiar. Além disso, esse segundo momento é também marcado pela aproximação entre campo e cidade, bem como pela desvalorização (relativa) dos produtos do campo pelos da cidade. Nesse segundo momento, a polenta deixa de ser alimento cotidiano, dando lugar ao arroz e feijão"


  • O terceiro momento pode ser descrito como uma crise originária do segundo. A partir de um quadro de insegurança alimentar, inicia-se uma revalorização do campo e de seus produtos, que passam a ser vistos como uma saída para a crise alimentar instaurada, gerando algo como uma busca pelas origens entre muitas famílias de raízes camponesas e imigrantes. Isso pude observar na família pesquisada, sendo fácil perceber o novo lugar que a polenta passou a ocupar na dinâmica familiar: a de um alimento que remete às origens da família, que liga e participa da história familiar inteira".






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