terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Oriundi (Cinema) - Mazzaropi, o caipira ítalo-brasileiro (1)


Racismo, religião e política foram alguns dos temas que o ator e cineasta Amácio Mazzaropi abordou ao longo de sua carreira artística. “Sua italianidade, assimilada à caipirice, evidencia a permanência de uma cultura que envolve elementos fundamentais de dois modos de vida: o rústico e o do imigrante, ameaçados pelos tentáculos impessoalizantes da sociedade de consumo, e que resistia bravamente contra as características da economia capitalista (do livro Mazzaropi: o jeca do Brasil de Glauco Barsaili - Campinas: Editora Átomo, 2002).

A história dos Mazzaropi no Brasil data do início do século XX quando o casal Amazzio e Anna deixam a Itália, acompanhados de seus filhos, entre eles Bernardo. Para a família, o “Far l’América" significou, num primeiro momento, trabalhar na agricultura (Dourados – SP e depois no Paraná). Uma rápida biografia do autor pode ser consultada no site Em 1910, Bernardo Mazzaropi (motorista de automóvel de aluguel) já casado com Clara Ferreira (empregada doméstica) muda-se para São Paulo. Dois anos mais tarde, numa casa no bairro de Santa Cecília (região central) nascia Amácio Mazzaropi.

Em 1922, os Mazzaropi fixam residência em Taubaté (SP) e Amácio é matriculado no Ginásio Washington Luís. Em casa, estuda e decora textos do livro Lira Teatral. No monólogo Chico, imita um tipo caipira que agrada em cheio numa festa da escola. Nascia aí a veia mais forte de Mazzaropi que anos mais tarde, depois de passar pelo teatro e pelo rádio, viria a inserir, de maneira marcante, o seu nome na história do cinema nacional. Uma rápida mas interessante cronologia da vida do ator e cineasta pode ser encontrada no site Museu Mazzaropi

Na visão Edilene Maia e Moacir José dos Santos no trabalho que realizaram na Universidade de Taubaté/ Departamento de Comunicação Social, “a obra cinematográfica desenvolvida por Amácio Mazzaropi contribui para a consolidação de uma memória social sobre o caipira”.


Os autores lembram que os “traços estereotipados apresentados nos filmes exageram o estranhamento cultural entre o homem do campo e o universo urbano. Os seus filmes constituem o registro da agressiva urbanização brasileira, com conseqüências profundas na memória social. A cidade é apresentada como voraz, os habitantes não se importam em levar vantagem sobre a suposta incapacidade do caipira em compreender as relações urbanas”. 

“O caipira, símbolo da simplicidade e bondade do homem do campo é apresentado, simultaneamente, como ingênuo, ludibriável, e como engenhoso, capaz de simular a própria ingenuidade, mas leva vantagem no desfecho das situações em que está envolvido”.

“No filme Tapete Vermelho essa caracterização do caipira é recuperada, constituindo metalinguagem que ilumina os traços principais do trabalho de Mazzaropi. O enredo aponta os principais conflitos que o público dos seus filmes enfrenta, como o fechamento das salas de cinema, transformadas em templos religiosos e os restantes, concentrados em locais de intenso consumo, shopping centers, não exibirem produções sobre o homem do campo”.

Soleni Fressato, pesquisadora da Univeridade Federal da Bahia lembra, num , trabalho sobre Amácio Mazzaropi  que caipira é o personagem emblemático em todos os seus 32 filmes, mesmo naqueles em que a narrativa transcorre no meio urbano, ele o personificou, inspirado nos precursores José Gonçalves Leonardo e Sebastião Arruda. “O caipira representado por Mazzaropi, característico do interior do estado de São Paulo, diferente do almejado pela ideologia desenvolvimentista, utiliza-se de práticas conservadoras para enfrentar as adversidades”.


“Inserido num contexto socioeconômico de avanço das práticas capitalistas e das injustiças sociais que compunham as relações no campo, inclusive a luta pela terra, o caipira não abandona, nem deixa corromper seus valores tradicionais baseados na honestidade, na solidariedade e nos laços familiares. Diante do exposto, a presente comunicação tem por objetivo analisar de que maneira e em que medida o caipira representado pelo cineasta Amácio Mazzaropi, se contrapõe às práticas capitalistas, tendo por fonte de pesquisa o filme Jeca Tatu (direção de Milton Amaral, 1959)”.

Para Luiz Otavio de Santi, autor do documentário "Mazzaropi: Feição e Prosa” Amacio Mazzaropi foi um cineasta do povo.”Na medida em que o público popular faz parte do cinema, Mazzaropi é a referência. Fez 32 filmes, dos quais 24 com dinheiro próprio, um caso único no cinema nacional. Como ele mesmo dizia, troféu não paga as contas, portanto ele sabia que sua estética poderia ser questionada, mas seu contato com o povo não".


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