segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Oriundi - As caricaturas de Lemmo Lemmi (1)


Juó Bananere
O ano era 1911 e nas páginas da revista “O Pirralho” (fundada por um jovem que viria a ser um dos ícones do Modernismo no Brasil, Oswald de Andrade), o cronista Juó Bananére (pseudônimo do jovem estudante de engenharia, Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, de 19 anos) faria a sua estréia substituindo Annibale Scipione (pseudônimo do próprio Oswald), que publicava crônicas no estilo macarrônico. 

O textos de Bananére foram associados a uma caricatura criada por  Voltolino, pseudônimo de João Paulo Lemmo Lemmi (1884 -1926), paulistano, filho de imigrantes italianos.

“Com trabalhos publicados em diversas revistas e jornais, inclusive para a imprensa de língua italiana de São Paulo, os desenhos de Voltolino traduzem o ambiente urbano da Primeira República paulistana.

O caricaturista viveu e frequentou preferencialmente o triângulo das Ruas Direita, São Bento e XV de Novembro no centro de São Paulo, onde se localizavam as redações dos principais jornais e revistas para os quais trabalhava. A partir do centro, Voltolino desenhava com espontaneidade a caricatura da nascente sociedade proletária urbana e o correspondente ambiente industrial dos bairros da Barra Funda, Pari, Brás, Belenzinho, Móoca e Vila Prudente”. (Memória Fundap).


Segundo Ana Maria Belluzzo, no livro Voltolino e as Raízes do Modernismo, o personagem baseou-se em um tipo real da época: "Foi Francisco Jacheo, conhecido humorista, inseparável de Voltolino, que usava o nome de dom Ciccio, quem inspirou a criação de Juó
Bananére"

Verbete da Enciclopédia Itaú Cultural recupera texto de Herman Lima (História da caricatura no Brasil, 3º Volume III. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1963. p.1238-1239) que assim descreve Lemmo Lemmi.


'Um dos desenhistas de humor mais importantes e atuantes da imprensa paulistana em expansão no início do século XX, João Paulo Lemmo Lemmi, apesar de filho de imigrantes italianos, declarava-se paulistano da gema. Filho do artesão Ernesto Lemmi, aos 12 anos é levado a Pisa, Itália, para completar seus estudos técnicos. De volta ao Brasil, se dedica à caricatura de forma autodidata, tendo colaborado com alguns jornais locais na Itália.

É na imprensa paulistana de língua italiana que encontra espaço para iniciar sua carreira por volta de 1905. Em jornais como Cara Dura: il giornale piu stupido del mondo,1 Il Grilo di Flora e Il Pasquino Coloniale, Voltolino consolida os principais traços de seu trabalho: de teor combativo, seu desenho satírico coloca-se a serviço dos problemas sociais e políticos de seu tempo. Como ítalo-paulistano, a figura do imigrante e seu processo de aculturação na nova cidade tornam-se os temas mais freqüentes do artista, ao lado dos efeitos da industrialização nascente no âmbito do espaço urbano e as agruras do cotidiano dos seus novos agentes sociais, como o operariado e a pequena burguesia comercial, sem esquecer da velha oligarquia e da igreja. Dá vida gráfica a Juó Bananére, personagem e pseudônimo literário de Alexandre Marcondes Machado (1892 -1933), tipo ítalo-paulista criado em 1911 para expressar a mistura das duas culturas através da linguagem falada e escrita.

É somente com sua participação na revista carioca O Malho, entre 1908 e 1909, que seu nome torna-se mais conhecido. Contudo, o reconhecimento nacional de Voltolino é consolidado por sua colaboração na revista O Pirralho, entre 1911 e 1917, na qual chega a publicar 20 desenhos por edição, inclusive diversas capas. A publicação, fundada por Oswald de Andrade (1890 - 1954) e Dolor de Brito, dedica-se ao mesmo tempo à crônica mundana, ao comentário político e à crítica da vida cultural de São Paulo, e  e é considerada por historiadores "o balão-de-ensaio" do modernismo de 22.

Em sua redação, Voltolino trava contato com as polêmicas artísticas de seu tempo ao trabalhar com os artistas Di Cavalcanti (1897 - 1976), Ferrignac (1892 -
1958), Guilherme de Almeida (1890 - 1969) e, naturalmente, o próprio Oswald. Por outro lado, reconhece-se que suas charges e ilustrações são responsáveis pela crítica política mais vigorosa da revista, sendo impossível, como observa o crítico Sérgio Milliet (1898 - 1966), "entender o início do século XX paulista sem os desenhos de Voltolino do Pirralho".

Seus desenhos são conhecidos pela audácia, pelo traçado ágil, nervoso e despreocupado, em que o efeito cômico é atingido mediante um grande poder de síntese, no qual a economia gráfica se destaca. A determinação do risco e rapidez da execução dão organicidade a seus personagens. Voltolino desenha-os primeiro a lápis para depois, já totalmente decidido, finalizá-los com contorno a nanquim. 

Com relação às cores, gosta de usar as puras e intensas, usualmente trabalhadas em contraste. Salvo quando precisa desenhar em papel couché, em que utiliza a aguada em nanquim e a aquarela, suas cores são saturadas. A linguagem teatral e sua coleção de gestos humanos, a animalização das personagens, os trocadilhos visuais e verbais, a ironia, o disfarce e o simbolismo são típicos de Voltolino. Contudo, deve-se notar que seu humor não é agressivo, ao contrário, por vezes é complacente, principalmente com o imigrante italiano, pelo qual nutre uma relação de afeto. 

Na verdade, soube distinguir em suas charges aqueles que "fizeram a América", e lutavam por reconhecimento social no Brasil às vezes de forma ridícula, dos que não conseguiram chegar lá. Em 1914, passa a contribuir para uma nova revista, A Cigarra, conhecida por seu cuidado com a qualidade gráfica. Também colabora com outras revistas importantes como a D. Quixote, Revista do Brasil, Panoplia, O Parafuso, O Queixoso, O Sacy. Voltolino trabalha também como ilustrador de anúncios e cartazes, além da ilustração de livros. É responsável
pelas ilustrações coloridas da primeira edição de A Menina do Narizinho Arrebitado (1920) e Marquês de Rabicó (1922), ambos de Monteiro Lobato (1882 - 1948)”.

Um comentário:

  1. Parabéns por seu trabalho e pela abrangência que ele mostra: a construção da pujança de São Paulo. No link abaixo, tem o trabalho que fiz sobre o Momento Itália/Brasil:
    http://blogdodelmanto.blogspot.com/2011/10/momento-maior-italiabrasil-conde.html
    Espero que seja do seu interesse,
    Codialmente,
    Armando Moraes Delmanto
    (blogdodelmanto.blogspot.com)

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