sábado, 1 de janeiro de 2011

Memorie - Recordações do Bexiga

A prefeitura mantém ativo o site São Paulo Minha Cidade, aberto para receber postagens relatando memórias pessoais sobre bairros paulistanos. É o caso de  Sao Paulo Minha Cidade, que relata recordações do Bexiga, bairro que recebeu grande contingentes de italianos.

"Quem te viu, que te vê, meu saudoso Bexiga. Quem te viu como eu, vem a lembrança a amizade entre os vizinhos, a parceria sincera que norteava os amigos, sem falar da ajuda mútua sempre presente nas famílias "bexigentas". Bons tempos foram aqueles.

Nasci na Rua Major Diogo, no. 680 (esta rua começa na Rua Santo Antonio e termina na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio).

Minha avó paterna veio da Itália (palazzo San Gervásio, província de Potenza), viúva, com seus dois filhos: Domingos e Carlos. Este último, Carlos Belviso, veio a ser meu pai. Minha mãe chamava-se Adelina Rubano.

Chegada da Itália, foi morar na Rua Major Diogo, no. 735, onde casou-se novamente com Antonio Lancelotti (bastante conhecido no bairro, por sua honestidade e bondade com o próximo).

Minha infância foi alegre, saudável e muita amizade entre os coleguinhas, aliás, uma das muitas marcas do Bexiga.

Fiz o jardim da infância numa escola no Morro dos Ingleses. Lembro-me como se fosse hoje, o sabor ainda na boca, do meu preferido, o sanduíche de pão doce com bastante mortadela.

Em seguida ao jardim da infância estudei na escola italiana "Arnaldo Pratola", que ficava na mesma rua onde nasci, e seu proprietário e professor era o famoso educador Giuseppe Cardinale. Esta escola lançou as primeiras sementes para a formação futura de nosso caráter. A disciplina, a honestidade, a honradez, a verdade, sempre eram uns dos seus lemas. Ah!, se tivéssemos hoje escolas desse naipe... Que maravilha.

A conclusão do curso primário deu-se no Grupo Escolar Júlio Ribeiro, na Rua Major Diogo, no. 200. Escola muito boa em que seus professores realmente se dedicavam. Que boas lembranças tenho da professora dona Marina, que junto dos alunos, um a um, se preciso, nos ensinava com paciência.

Nesse grupo escolar, nós, brasileiros atuantes (olhe só, tínhamos pouca idade) fazíamos coleta de borracha para ser usada na 2a. Guerra Mundial, e depositávamos no pátio da escola. Conseguíamos verdadeira montanha de borracha. Época muito boa essa.

Já mocinho, passei a estudar no Colégio Santo Alberto, na Rua Martiniano de Carvalho, junto à Igreja de Nossa Senhora do Carmo, dos padres carmelitas. Lembro-me, com saudades e admiração, dos professores: Benedito, na matemática, Mendes, em português, Mecozzi, no desenho, Oswaldo, na geografia, o diretor frei Romualdo, e outros que não me vêm à memória.

Nessa época os amigos eram muitos. O Massao (Mário), filho do seu José e da dona Maria, japoneses, proprietários da quitanda, era parceiro algumas vezes do jogo de cartas típico italiano chamado Tre sete. Falava também um pouco do italiano. A coisa mais gostosa na quitanda era o coco em pedaços e o caqui.

Bem em frente de minha casa, num humano cortiço, filho de dona Giusepina e do Sr. Antonio "verdureiro", meu amigo Valter Pugliese era um constante parceiro nas brincadeiras (futebol, jogo de bolinhas de vidro, bate bate de folhinhas, com estampas dos jogadores da época). Na mesma "mansão" morava um crioulo, cujo apelido era Nori, ótima pessoa e também falava um pouco de italiano. Onde você o encontrava estava sempre sorrindo.

Meu outro vizinho do lado esquerdo de minha casa, grande amigo também, o "Grute", seu apelido, cujo nome era Walter e sobrenome Saladino, e seus irmãos Paschoal e Bolonha.

Recordo-me da família Cimino, que morava em frente. Lá juntavam-se várias mulheres do bairro (pagas) para "catar" amendoim (separar as impurezas). Era uma verdadeira zorra. Nós crianças ficávamos vendo e rindo de suas palhaçadas. O divertimento era geral. Outro amigo que não esqueço é o Armando Albanese e seu irmão. Este foi o precursor da famosa até hoje Padaria São Domingos. Caso "chocante" para aquela época foi que a irmã deles casou já grávida. Que bobagem hoje.

O domingos Barinote, que se formou médico, os Carbone, o Antonio Bracco, seus irmãos Zé Molinho (José) e Paulo. Que penca de amigos, mas amigos verdadeiros.

O que não me sai da memória são as duas "vendas" (empórios) situadas na minha rua: a do Felício De Carli e a outra do Gino Vanucci e seu irmão Mário. Na do Felício fazíamos as compras dos mantimentos e outros gêneros na velha caderneta, com pagamento mensal. Na do Gino, além de várias compras para abastecer minha casa, eu adorava, não perdia por nada, o famoso sanduíche composto de duas fatias grossas de queijo parmesão e, como recheio, uma também grossa fatia de mortadela. Família excelente os Vanucci, os Lupo, cujo amigão Dino Vanucci Lupo era companheiro de saídas, de cinemas, de jogo de futebol. E o Roberto Muraco, filho do açougueiro, que tinha em sua casa dois verdadeiros guardiões, ninguém entrava em sua casa: eram os ferozes galos, muito pior que qualquer cachorro.

Outro grande colega (e era grande mesmo) foi o russo-chinês de nome Dimitri Mamonkin. Possuía uma força descomunal: levantava um motor de carro facilmente. Ninguém procurava brigar com ele, ninguém era bobo para tal. Outro de que me lembro era o André, filho do sr. José, dono do bar na esquina da Rua Major Diogo e Conselheiro Carrão. A gente comia petiscos, e de graça. O André que patrocinava.

Os domingos eram sempre esperados. Íamos nos cinemas, ora Espéria, ou o Cine Rex, assistir os seriados imperdíveis como o zorro, Tom mix, Tarzan e outros. Isto durante à tarde. Pela manhã acompanhava meu pai até a cantina mais famosa do bairro, a do Capuano. O vinho era italiano em toneis, a sardela com pão italiano, as azeitonas gregas enormes. Que delícia. Que tempos. Voltávamos e na grande mesa a família toda junta saboreava a famosa macarronada com brachola e o frango com batatas assado no forno.

Este é o velho bairro do Bixiga, que tinha os melhores pães da região. Quem não conheceu a padaria Basilicata, a Padaria do Paladino, a padaria São Domingos. E a famosa feira da Rua Maria José, que todas as sextas-feiras eu acompanhava meus pais nas compras e ajudava a carregar as cestas. Nunca faltava o velho café Tiradentes.

Todas as tardes (religiosamente) aguardávamos o querido amigo jornaleiro Mário, que vinha gritando pela rua: “olha a Gazeta, olha o Diário, olha a Gazeta Esportiva”. Não é que de tanto passar pela Rua Major Diogo, olhou, namorou e casou com a filha da dona de uma pequena venda (não me lembro o seu nome)? Que festança foi realizada!

Existia ainda, e não faltava nunca, o vendedor de pasteis, os mais gostosos que comi, um senhor de cor negra e muito gentil.

Na mesma Rua Major Diogo, esquina com a Rua Humaitá, num porão, foram feitos os melhores pirulitos por um senhor italiano (não recordo seu nome), onde a criançada fazia fila para comprar os estupendos pirulitos.

Outros vendedores, como os de cogumelos enormes, e o vendedor de queijo que dava nomes a eles como, por exemplo: "queijo Pina Fachioni". A Pina era uma artista italiana da época.

Lembro do Teleco, que fundou a escola Vai Vai. Sua mãe está viva e mora no mesmo endereço, na Rua Major Diogo. Ela deve ter mais de cem anos. Não lembro seu nome, só sei que ela era muito brincalhona.

Já mais na juventude, aos sábados à noite, os amigos íamos à Pizzaria do Giordano, onde tinha as melhores pizzas de São Paulo. Esta pizzaria ficava na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, do lado do não mais famoso cine Paramount, com seus famosos camarotes. Era muito chique.

E a famosa Igreja Nossa Senhora de Achiropita. Lá fiz minha primeira comunhão. Recordo-me do padre Dom Orione, um eterno filador de cigarros.

Quantas lembranças esquecidas ficaram para trás. O tempo não passa, voa. Já se passaram muitos anos dos acontecimentos narrados e recordados. Cada personagem seguiu seu caminho. Alguns moram ainda no bairro, penso eu. Outros seguiram estradas diferentes, lugares diferentes.

As crianças, os jovens, os lugares, ainda estão lá no Bexiga daquela bela época. Senão, pelo menos estão na memória.

Saí do meu Bexiga pelos idos de 1971 e casei com a dona Judite. Hoje moramos no Parque Continental, no bairro do Jaguaré, antes bairro do Butantã".

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

História (231 ): Templos religiosos e imigração italiana em São Caetano do Sul (2)

No site da Fundação Pró- Memória (autarquia municipal) texto autoria do jornalista Alexandre Toler Russo, discorre sobre a construção de igrejas  São Caetano do Sul, obras ligadas diretamente a imigrantes italianos e descendentes.   
 
"O crescimento da população de São Caetano exigia a criação de um templo de maiores proporções. De fato, a igreja do Bairro da Fundação, construída pelos colonos, já não podia comportar o grande número de fiéis da cidade. Desse modo, em 1932 já estavam em andamento os trabalhos para a construção da Igreja Sagrada Família.Em 1936, o serviço estava terminado.

Os idealizadores da chamada Matriz Nova foram os padres José Tondim e Alexandre Grigolli. Erguer o templo só foi possível graças à colaboração dos cidadãos locais, das indústrias e do comércio. 
A conclusão das obras ocorreu na época em que padre Ézio Gislimberti comandava a paróquia. A decoração interna foi executada pelos pintores Pedro Gentili e Ulderico Gentili".

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

História (230 ): Templos religiosos e imigração italiana em São Caetano do Sul (1)


A questão da religiosidade sempre acompanhou a trajetória dos imigrantes italianos em terras brasileiras. Na cidade de São caetano do Sul (SP) não foi diferente, conforme relato encontrado no site da Fundação Pró- Memória (autarquia municipal), em texto de autoria do jornalista Alexandre Toler Russo.
 
"Em 1717, os monges beneditinos iniciaram a construção de uma capela dedicada a São Caetano. Ficava no mesmo lugar em que hoje se encontra a Paróquia São Caetano (Matriz Velha). Em 1772, profunda reforma foi empreendida, sendo instalados coro, capelamor, sacristia, torre e sino. Nos séculos XVIII e  XIX, missas eram rezadas, todos os domingos, para os moradores do Bairro de São Caetano e para os escravos da fazenda dos monges beneditinos.

Na capela também eram realizados sepultamentos. No final do século passado, os imigrantes italianos que vieram para o Núcleo Colonial de São Caetano depararam- se com o pequeno local de culto. Em 1883, demoliram a capela e construíram a igreja conhecida, hoje em dia, por Matriz Velha.

Matriz Velha em 1908


Até o ano de 1911, quando foi instalada a Paróquia de Santo André, os habitantes de São Caetano não dispunham de assistência religiosa satisfatória. A partir dessa data, contudo, o padre Luiz Capra, sempre aos domingos, passou a celebrar missas no templo erguido pelos colonos.

Em março de 1924, finalmente, foi constituída a Paróquia São Caetano, confiada aos padres estigmatinos. O primeiro vigário foi o padre João Batista Pelanda. O coadjutor era o padre Alexandre Grigolli. Em 1946, a igreja foi contemplada com um altar feito de mármore - trabalho de Garbarino Giácomo Filho".

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Italiani – O legado de Celeste De Nardi na colonização de São Caetano do Sul (2)



O pioneirismo dos De Nardi legou à cidade o chamado Palacete De Mardi, hoje sede do Museu Histórico Municipal de São Caetano do Sul, administrado pela  Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul , autarquia municipal criada  em junho de 1991, que em texto assinado pelo historiador Clovis Antonio Esteves resgata a história do casarão. 

" A família dos De Nardi residiu no Palacete por muitos anos. No espaçoso terreno havia um pomar com vários tipos de frutas e, na frente da casa, havia um jardim com muitas flores e um frondoso cipreste.

Ao lado deste jardim, havia uma capela com a imagem de São João Batista, aonde o padre vinha rezar o terço em determinadas épocas. Aos domingos, a família se reunia para o almoço ao redor de uma farta mesa, em que o patriarca recordava os momentos passados na Itália, e todos ouviam com muita atenção e interesse.

Em 1937, o Palacete De Nardi abrigou em seu espaço, que foi dividido, uma família oriunda de Minas Gerais, mais precisamente da cidade de Andradas. Esta família era formada pelo casal Gabriel Rosa Alves e Mariana Norberta de Souza e seus nove filhos.

A família De Nardi permaneceu no Palacete até 1940. Em seguida, o local foi vendido para a família Perrella, que morava  em frente. Depois, a residência acabou sendo uma padaria, e abrigou vários inquilinos, sendo inclusive sede de time de futebol, o América Futebol Clube, na década de 1950. Nos anos 1970, o imóvel já tinha sofrido várias modificações e se encontrava em total abandono.

No dia 9 de agosto de 1985, o prefeito Hermógenes Walter Braido, pelo decreto 4674/85, declara o referido imóvel de utilidade pública para fins de instalação do Museu Municipal. É iniciado o processo de restauração do imóvel, com a orientação técnica do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT), órgão público estadual. Após três anos de exaustivo trabalho, o Palacete De Nardi foi entregue em 29 de dezembro de 1988 para abrigar o Museu”.


Italiani – O legado de Celeste De Nardi na colonização de São Caetano do Sul (1)


A imigração italiana  na região de São Caetano do Sul (SP), a família De Nardi tem papel de destaque. O pioneirismo dos De Nardi é resgatado no site da Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul , autarquia municipal criada  em junho de 1991, em texto assinado pelo historiador Clovis Antonio Esteves.


“A família De Nardi chegou a São Caetano do Sul em 28 de julho de 1877, na primeira leva de imigrantes italianos vindos da província de Treviso, Itália. Tinha como patriarca Giovanni De Nardi, que recebeu o lote 24 do Núcleo Colonial, instituído pelo Governo Imperial com o objetivo de iniciar a colonização da Fazenda São Caetano, que até então pertencia aos monges beneditinos, substituindo o trabalho escravo por trabalho livre para obter maior desenvolvimento da região.

Celeste De Nardi, um dos filhos de Giovanni, recebeu o lote 23 do mesmo
Núcleo. Em 1880, casou-se com Lorenzina Gava, sendo este casamento o primeiro a ser registrado em São Caetano. Celeste e Lorenzina foram morar na casa de Giovanni De Nardi, que possuía uma olaria de fabricação de tijolos.

Celeste De Nardi havia aprendido o oficio de pedreiro já na distante Itália, e foi
ele que desenvolveu o trabalho de reforma da antiga capela dos beneditinos, logo no início do Núcleo Colonial. Mais tarde, começou a construir a sua casa, no lote
vizinho ao de seu pai; em 1896, quando terminou a obra, foi residir neste local. 

Esta casa com grandes cômodos tinha uma fachada suntuosa e uma arquitetura bastante arrojada, inspirada nos modelos de construções da Europa. Este padrão de residência não era comum naqueles tempos, e só as famílias mais abastadas podiam construir algo deste gabarito. Os tijolos empregados foram produzidos na olaria dos De Nardi.

Esta casa, que chamava a atenção pela sua grandiosidade, passou a ser chamada de Palacete De Nardi. Celeste De Nardi foi também quemdesenvolveu os trabalhos de construção da Matriz Velha, bem como de outros prédios  em São Caetano, como a sede da Sociedade de Mutuo Socorro Príncipe de Nápoli e a Cadeia Pública.

Logo que a família De Nardi foi morar no Palacete, um dos cômodos da
moradia foi cedido para abrigar a escola feminina, uma vez que as aulas estavam
sendo ministradas, provisoriamente, na igreja, já que as casas das antigas senzalas onde funcionavam as escolas da época, tanto feminina como masculina, haviam sido cedidas a moradores. Esta escola, que passou a ser denominada Primeira Escola Feminina, permaneceu no Palacete até a construção do primeiro prédio do grupo escolar".

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

História (229 ) – “Far l’America (134 )": Rivalidades regionais entre os imigrantes italianos na cidade de Campinas (2)

A pesquisadora Maria Lúcia de Souza RangelRicci, do Centro de Memória Unicamp, autora do artigo ”Conflitos D’Italianità e Ambigüidades das Diferentes Societàs em Campinas e seus Distritos de Sousas e Joaquim Egídio (SP)”, publicado no site da  Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica, assim descreve o associativismo regional dos imigrantes.


“(.... ) Os italianos que se fixaram em Campinas englobando dois de seus atuais Distritos - Sousas e Joaquim Egídio - procuraram se reunir por meio de associações que conservavam um cunho nitidamente regional, aliás, idéia corrente na Itália de fins do século XIX, quando o Estado há pouco formado, não havia ainda sobrepujado a noção de região (RIOS, l950). Predominaram as ligas e sociedades beneficentes, de mútuo socorro, com denominações patrióticas, onde os indivíduos cultivavam também as tradições e atavismos de sua terra natal; as festas que promoviam eram as que prevaleciam em suas regiões e não as do país que estavam habitando, as quais lhes eram indiferentes.
(...)Assim, onde estivessem algumas dezenas de peninsulares, logo surgiria uma associação que sempre manteve espírito individualista o que constituiu sério obstáculo para o florescimento e continuidade da maior parte das associações.
Com seus estandartes, bandeiras e com número variável de participantes, as associações italianas promoviam comemorações principalmente em suas datas nacionais (onde era indispensável a presença da banda musical).
Em Campinas, desde o final do século XIX várias sociedades foram formadas e, em 1883, foi fundada a XX de Setembre que além de bailes promovia piqueniques no Bosque das Caneleiras (hoje Jequitibás), além de festas típicas italianas.
Foi muito comentada pela imprensa campineira da época a festa promovida por esta Sociedade em julho de 1897, em homenagem à memória de Sadi Carnot, sendo que um grande baile teve lugar no Salão Vitória, o mais imponente da Campinas de então. Mas, a imprensa ainda deu vivo destaque à discussão havida durante a comemoração entre o presidente da XX de Setembre - Vito Zaccara - e Antônio Vignone, que conduzia a Famigliari Regina Margherita. O desentendimento, fruto da rivalidade existente entre ambas, foi decorrente de a Regina Margherita estar com saldo em sua conta menor que a XX de Setembre, além do número de sócios desta última associação ser maior.
Como se vê os motivos nem sempre eram relevantes e, com isto, as sociedades iam se enfraquecendo. Pouco tempo depois estas duas deixaram de existir, cedendo lugar a outras que se dedicaram principalmente à manutenção de escolas onde o prioritário era o ensino do italiano, mas sem deixar de lado a função assistencial”.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

História (228 ) – “Far l’America (133 )": Rivalidades regionais entre os imigrantes italianos na cidade de Campinas (1)


O caráter heterogêneo da imigração italiana no Brasil, marcado pela diferenças sócio-culturais dos pioneiros oriundos de diferentes regiões da Península Itálica, se refletiu, de imediato, na vida cotidiana, como demonstra a pesquisadora Maria Lúcia de Souza RangelRicci, do Centro de Memória Unicamp, autora do artigo ]”Conflitos D’Italianità e Ambigüidades das Diferentes Societàs em Campinas e seus Distritos de Sousas e Joaquim Egídio (SP)”, publicado no site da  Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica .
  
“Em 1874, encontramos em Campinas os primeiros italianos e já em l896 representavam eles quase o dobro das demais correntes imigratórias. Em l907, ocupavam o primeiro lugar no Estado de São Paulo nas estatísticas referentes à imigração.

A maioria dos imigrantes italianos chegou às regiões ora estudadas procedentes do Norte da Itália, contratado para o trabalho na lavoura do café embora sem ter especialização e nem mesmo ofício determinado e com família já constituída. Mas, todos vieram com seus seculares preconceitos regionais.

Não seria, pois, com indivíduos tão heterogêneos, com tendências de independência econômica, de enriquecimento, além de muitos almejarem logo voltar ao seu torrão natal, possível formar quadros fixos de operários permanentes em determinado ofício.

Com um pessoal que assim pensava, com um nacionalismo exacerbado, desprezando o país em que se encontravam, apontando como estigma as doenças tropicais, as pragas, os insetos, considerando inferiores negros, mulatos e caboclos vendo-os como vadios, dados à embriaguez, mal vestidos e alimentados, não seria possível se esperar deles nos primeiros momentos da chegada algum interesse proveitoso à vida brasileira.

(...) A crise cafeeira iniciada em l929 transformou a situação até então existente nas áreas paulistas: grandes latifúndios foram repartidos e até abandonados e os colonos puderam, com o que conseguiram amealhar, se transformarem em pequenos proprietários, formarem seus sítios com a família e, assim, se emanciparem.

Especificamente no caso de Campinas, considerando-se que constituíam um grande contingente, não tardou muito para que se envolvessem em algumas confusões, apesar de seu temperamento geralmente alegre, mas agitado. Assim, uma das primeiras que se tem notícia foi a 7 de abril de 1879 - a chamada Revolução dos Italianos - quando saíram às ruas, em grande arruaça e armados, unicamente, de... sapatos! Nunca se soube exatamente o porquê deste movimento; pelo que noticiou a imprensa da época poderia ter sido para obtenção de melhores salários nas fazendas e mais trabalho na zona urbana.
Foi este acontecimento o germe primeiro para a futura criação do Vice-Consulado na cidade a fim de que os problemas que por vezes surgiam mesmo fossem resolvidos através da autoridade competente”.